Audiência Pública como estratégia interdisciplinar para aquisição de conhecimentos de química.

ISBN 978-85-85905-19-4

Área

Ensino de Química

Autores

Nogueira de Sá, S.R.A. (UFF) ; Nascimento Filho, A.P. (UFF) ; Marques, L.F. (UFF) ; Vasconcelos, J.M. (UFF) ; Rodrigues e Silva, I.F. (UFF) ; Vidinha, I.C.S. (UFF) ; Campos de Souza, G. (UFF) ; Correa, G.B. (UFF) ; Correa, I.B. (UFF)

Resumo

Neste trabalho, realizado com alunos da 3ª série do Ensino Médio em uma escola pública do Rio de Janeiro através do Programa Institucional LIFE UFF - Ciências da Natureza, Sociais e Humanas em diálogo e do projeto de extensão Instrumentalização e Contextualização para o Ensino de Ciências, apresentamos uma estratégia interdisciplinar para aquisição de conhecimentos de química – funções orgânicas, desenvolvimento de consciência ambiental e reconhecimento de valores humanos. A estratégia, uma adaptação do júri simulado, fomentou a participação dos alunos através de pesquisa e debates. Os resultados positivos foram percebidos tanto na participação dos alunos, quanto nas avaliações feitas pelo professor.

Palavras chaves

Estratégias de Ensino; Ensino de Química; júri simulado

Introdução

A LDB (BRASIL, 2000) estabelece que a educação básica vise à formação do cidadão pleno – um sujeito de direitos consciente de seu lugar e papel na sociedade. No entanto, a educação básica, em particular nas Ciências da Natureza (CN), ainda não consegue alcançar tal objetivo e, menos ainda, promover a formação do cidadão cosmopolita - indivíduo pertencente a uma nação, mas consciente de ser parte integrante de um mundo complexo e globalizado (CORTINA, 1996), demanda cada vez mais crescente no século XXI (DELORS, 2000). A formação do cidadão cosmopolita exige reflexões sobre direitos humanos e os direitos coletivos da humanidade, em especial sobre o de herdar um planeta saudável, que demanda os cuidados ao meio ambiente e à defesa ecológica (BENEVIDES, 2012). Para Morin (2006), embora haja uma tomada de consciência dos problemas envolvidos, ela é tímida e não conduziu a nenhuma decisão efetiva, daí a necessidade de promover no educando a consciência planetária. Apresentamos neste trabalho um exemplo de atividade interdisciplinar adaptada da “estratégia de ensinagem júri simulado” (ANASTASIOU E ALVES, 2003), aplicada a alunos da 3ª Série do ensino médio da Rede Pública do Rio de Janeiro, para o desenvolvimento de competências e aquisição de conhecimentos e valores. A atividade foi realizada pela equipe do Laboratório Interdisciplinar de Formação de Educadores em parceria com a do projeto de extensão Instrumentalização e Contextualização para o Ensino de Ciências da UFF, e consistiu na simulação de uma audiência pública para apresentação, por empresas, e escolha, pelo governo, de propostas para a despoluição da Baia de Guanabara, onde todos os argumentos apresentados pelas partes envolvidas deviam levar em conta os impactos ambientais, sociais e econômicos.

Material e métodos

O tema bimestral para as três disciplinas das CN foi Biotecnologia. Na Química, as funções orgânicas foram trabalhadas a partir de aplicações da biotecnologia cinza e azul através de 4 aulas dialogadas e da atividade “Audiência Pública”. A atividade foi desenvolvida em 4 etapas. 1ª – Motivação: exposição de vídeos sobre a poluição da Baia e apresentação do problema (Avaliação de propostas de duas empresas para a despoluição da Baia da Guanabara antes das Olimpíadas do Rio). 2ª – Organização/orientação: Turma organizada em 4 grupos: I- Governo - governador, vice-governador e secretário de meio ambiente (analisar vantagens econômicas, prazo de execução, vantagens ambientais e interesses sociais das propostas); II- Empresa A (usa biotecnologia) e III- Empresa B (não usa biotecnologia) (3 alunos/empresa - apresentar as principais vantagens da sua proposta para resolver o problema de imediato e saber apontar as desvantagens do adversário); IV- Comunidade - representantes comunitários e pescadores (4 alunos - estudar os benefícios e malefícios que as técnicas de cada proposta poderão acarretar direta ou indiretamente às comunidades, exigindo que tenham peso na escolha do governo e que sejam implantadas políticas públicas de educação e conscientização ambiental). 3ª – Pesquisa, formulação das propostas e preparação para o debate (realizada em 3 semanas, fora do horário de aula com orientação de 1 licenciando por grupo – confecção do relatório da pesquisa/entrega das propostas). 4ª – Audiência pública (cada empresa teria 10 minutos para expor a proposta, a Comunidade 10 minutos para apresentar suas exigências, após o que o Governo teria 10 minutos para apresentar suas considerações, durante 20 minutos ocorreria um debate e ao final decidiriam por uma proposta).

Resultado e discussão

Todos os grupos entregaram os relatórios no prazo estipulado. Na Audiência pública a ordem de apresentação foi sorteada: Empresa A - tratamento do petróleo derramado na Baía de Guanabara através de bactérias que degradam hidrocarbonetos e não afetam a biodiversidade marinha; Empresa B - tratamento através de eco barcos, eco barreiras e desvio e tratamento do sistema de esgotos; Comunidade - denunciou a falta de saneamento básico, exigiu do governo coleta seletiva de lixo e estação de tratamento de água e esgoto; Governo - questionou cada empresa e a Comunidade e ouviu as respostas: Empresa A – As bactérias não afetarão os seres humanos? (R: as bactérias estão sendo desenvolvidas com essa finalidade), Qual o tempo para execução? (R: O processo se iniciará antes das Olimpíadas, mas não terminará no prazo); Empresa B – Os eco barcos podem matar animais durante a coleta? (R: funcionários e radares visualizarão os animais a tempo de protegê-los), Suas rotas não afetarão as das barcas? (R: o controle marítimo garante rotas compatíveis); Comunidade – A presença de lixo na domestico na Baia não é culpa da população? (R: Jogamos na Baia por não termos saneamento nem coleta de lixo). O debate a seguir foi muito contundente, os grupos enfrentaram os questionamentos com argumentos adequados, encontrando rapidamente soluções para as situações de conflito. Os empresários usaram todo ser poder de persuasão a fim de convencer que a sua empresa possuía a melhor solução. A Comunidade concluiu que os dois métodos eram necessários e que também deveria fazer sua parte, com o que todos concordaram. O Governo decidiu contratar as duas empresas e promover campanhas de conscientização em parceria com a Comunidade. Os relatórios foram devolvidos para serem aprimorados.

Conclusões

A atividade permitiu estimular o senso crítico e a consciência ambiental dos alunos, observar a ansiedade, a angústia, a raiva e os momentos de reflexão de cada um, e o quanto aprenderam em suas pesquisas. Além de permitir verificar a apropriação de conhecimentos específicos de Química, a atividade aproximou os estudantes do EM da postura de cidadão do mundo, que não deixa de lado o questionamento, a cultura local, os problemas sociais e ambientais, que cobra dos órgãos competentes os seus direitos e que reconhecem quando não cumprem seus deveres.

Agradecimentos

A CAPES e A PROEX-UFF pela concessão das bolsas de INICIAÇÃO À DOCÊNCIA (PIBID-UFF) e as bolsas de INICIAÇÃO CIENTÍFICA.

Referências

ANASTASIOU, L. G. C; ALVES, L. P. (Orgs.). Estratégias de Ensinagem. In: Processos de Ensinagem na Universidade. Pressupostos para estratégias de trabalho em aula. 1. ed. Joinville: Univille, 2003. p. 68-99.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais + (PCN+) - Ciências da Humanas e suas Tecnologias. Brasília: MEC, 2002.
BENEVIDES, Maria Victoria. Cidadania e Direitos Humanos. Disponível em <http://www.iea.usp.br/publicacoes/textos/benevidescidadaniaedireitoshumanos.pdf/view?searchterm=Cidadania+e+Direitos+Humanos>. Consultado em maio 2014.
CORTINA, Adela. La educación del hombre y del ciudadano. REVISTA IBEROAMERICANA DE EDUCACIÓN, Madrid, n. 7, p. 41-63, jan./abr. 1996.
DELORS, Jacques et all. Educação: um tesouro a descobrir - Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. 4 ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 2000.
MORIN, Edgar. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro.11ed. São Paulo: Cortez, 2006.

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