Utilização da tinta extraída do sumo do Jenipapo (Genipa americana L.): Proposta de uma sequência didática para o estudo de Funções Orgânicas a partir de saberes tradicionais indígenas

ISBN 978-85-85905-19-4

Área

Ensino de Química

Autores

Conceição, J. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ - UEPA) ; Araújo, S. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ - UEPA) ; Lobo-santos, V. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ - UEPA)

Resumo

O trabalho apresenta uma proposta de sequência didática a partir de saberes tradicionais da utilização do sumo do jenipapo (Genipa americana L.) para pintura corporal pelos Indígenas da comunidade Tembé, do Município de Santa Luzia do Pará (Nordeste do estado), para a disciplina Fundamentos de Química, com graduandos do curso de Licenciatura Intercultural Indígena da Universidade do Estado do Pará (UEPA), objetivando inserir os saberes tradicionais referentes à prática da pintura corporal com o sumo do jenipapo ao conhecimento científico abordado na disciplina, integrando saberes que facilitem a aprendizagem dos alunos.

Palavras chaves

Ensino de Química; Saberes tradicionais; Funções orgânicas

Introdução

O que se observa no processo educacional, principalmente no ensino de Química, é que esta disciplina se torna exaustiva e decoradora, o que pode ocasionar, conforme Godoy e Mesquita (2013), o questionamento por parte dos alunos aos professores sobre a importância de se estudar Química, pois muitas vezes os conhecimentos adquiridos nesta disciplina parecem não ter nenhuma relação com o cotidiano. Entende-se a necessidade de estabelecer um vínculo entre conhecimento científico e a realidade dos discentes, através da valorização de saberes populares que permeiam um lugar e/ou comunidade, pois para Chassot (2008), os conhecimentos tradicionais de um povo podem ser inseridos aos saberes escolares, necessitando que haja uma discussão acerca de práticas e valores que acabam sendo esquecidos. Com tais premissas, a partir de observações da utilização do sumo do jenipapo (Genipa americana L.) para pintura corporal pelos indígenas da comunidade Tembé, situada no Município de Santa Luzia do Pará, nordeste do estado, desenvolveu-se uma sequência didática para a disciplina Fundamentos de Química, para graduandos do curso de Licenciatura Intercultural Indígena da Universidade do Estado do Pará (UEPA), oferecido para esta comunidade, objetivando inserir os saberes tradicionais referentes à extração do sumo do jenipapo ao conhecimento científico que a disciplina aborda. O desenvolvimento da sequência didática procurou demonstrar como os conhecimentos tradicionais da comunidade indígena, podem ser componentes relevantes ao processo de ensino-aprendizagem de Química, considerando as ideias de Chassot (2008), o qual afirma que o diálogo entre saberes escolares e populares, quando mediado pelo conhecimento científico, facilita a leitura do mundo natural.

Material e métodos

Define-se sequência didática como um conjunto de procedimentos organizados em etapas pelo professor, interligadas e planejadas, objetivando ações que facilitem o processo de ensino-aprendizagem (KOBASHIGAWA et al., 2008). Observando a utilização frequente do extrato do sumo do Jenipapo para pintura, optou-se por utilizar esta atividade como tema norteador do estudo de Funções Orgânicas na disciplina Fundamentos de Química. A sequência didática então, se definiu em três momentos: No primeiro, os alunos realizaram o processo de extração do sumo do Jenipapo conforme os conhecimentos tradicionais da comunidade, isto é, realizando a coleta do fruto e utilizando a raiz da árvore Paxiúba (Socratea exorrhiza) para ralar o fruto, depositando o líquido em um recipiente feito do fruto da Cuieira (Crescenti acujete), a cuia. Complementando este momento, o professor explanou algumas informações a respeito do fruto. Para o segundo momento, o professor apresentou algumas substâncias químicas presentes no fruto, como introdução para estudo das Funções Orgânicas, enfatizando a substância responsável pela coloração da tinta e sua estrutura. No terceiro momento, finalizou-se o estudo das Funções Orgânicas, e os alunos utilizaram a tinta para a pintura corporal apresentando seus significados de acordo com suas tradições.

Resultado e discussão

Através do tema tradicional indígena, pintura corporal, utilizando o sumo do fruto do Jenipapo, desenvolveu-se o conteúdo de Funções Orgânicas, onde primeiramente os alunos extraíram o sumo conforme a tradição da comunidade indígena Tembé, processo este baseado na escolha do fruto ainda verde, que segundo o saber indígena, é o ideal para os devidos fins. O extrato deste sumo é obtido após ralar o fruto, e o recomendado é que o mesmo apenas seja aplicado no dia seguinte, pois se aplicado logo em seguida à retirada, sobre a pele ficará transparente, dificultando assim a pintura corporal. No dia posterior à aplicação, a tinta apresenta tonalidade mais escura. Durante a primeira atividade, observou-se que os alunos apesar de conhecerem o uso comum do mesmo, não mostraram conhecimentos acerca das características do jenipapeiro e de seu fruto, as quais foram apresentadas pelo professor como, ocorrência (Américas Central e do Sul; em toda a região brasileira), importância econômica (ex.: madeira para carpintaria em geral, uso do fruto na produção de doces) e importância ecológica (útil para plantio em áreas degradadas; abundante alimentação à fauna em geral). Na segunda aula, o professor apresentou algumas sustâncias encontradas no fruto, tais como: Hidratos de carbono, vitaminas B1 (tiamina), B2 (riboflavina), B5 (ácido pantotênico), vitamina C (ácido ascórbico) e cálcio. Desta forma, oportunizando a partir de suas estruturas a identificação das funções orgânicas presentes, enfatizando a fórmula estrutural da genipina (Figura 1), que é a molécula responsável pela cor do sumo. Somente analisando a estrutura da genipina, pode-se identificar algumas funções orgânicas como: éster, álcool e éter. De forma semelhante, a estrutura da vitamina C apresenta as funções éster e álcool.

Figura 1

Fórmula estrutural da genipina. Fonte: http://www.sigmaaldrich.com

Conclusões

O terceiro momento da sequência didática finaliza o vínculo estabelecido entre os conhecimentos tradicionais e científicos abordados na disciplina, através da socialização promovida pelos alunos e professor, demonstrando a prática tradicional da comunidade. Assim, utilizando uma sequência didática bem elaborada, os saberes tradicionais podem integrar um conhecimento científico tornando propício o estudo de determinado assunto facilitando a aprendizagem do aluno e valorizando os saberes tradicionais.

Agradecimentos

Referências

CHASSOT, A. Sete escritos sobre educação e ciência. São Paulo: Cortez, 2008.
GODOY, C.; MESQUITA, N. A. da S. Análise dos obstáculos epistemológicos no ensino de Química a partir das respostas dos vestibulandos: em foco as propriedades periódicas. Revista Didática Sistêmica, v. 14, n. 2, p. 95-110, 2013.
KOBASHIGAWA, A.H.; ATHAYDE, B.A.C.; MATOS, K.F. de OLIVEIRA;CAMELO, M.H.; FALCONI, S. Estação ciência: formação de educadores para o ensino de ciências nas séries iniciais do ensino fundamental. In: IV Seminário Nacional ABC na Educação Científica. São Paulo, 2008. p. 212-217. Disponível em:<http://www.cienciamao.usp.br/dados/smm/_estacaocienciaformacaodeeducadoresparaoensinodecienciasnasseriesiniciaisdoensinofundamental.trabalho.pdf>. Acesso em: 10 de maio de 2016.

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