ISBN 978-85-85905-19-4
Área
Ensino de Química
Autores
Romão, A.L.E. (UECE) ; Silva, R.C.B. (UECE)
Resumo
Em atendimento às orientações dos PCNs, que preconizam o abandono do modelo tradicional e estabelecem que o ensino-aprendizagem seja fundamentado na contextualização, na interdisciplinaridade e no respeito ao desenvolvimento cognitivo e afetivo do aluno, o ensino de Química deve trazer para sala de aula a discussão dos fenômenos vivenciados pelo aluno no seu cotidiano para permitir que ele os compreenda. Os procedimentos experimentais devem abordar os fenômenos que ele assiste no seu dia-a-dia. Nesse contexto, abordar o tema corrosão em aulas expositivo-experimentais pode evidenciar uma série de fenômenos que explicam a natureza química dos compostos, as reações que envolvem algumas transformações ocorridas com a matéria e fomentar discussões sócio-ambientais.
Palavras chaves
contextualização; interdisciplinaridade; corrosão
Introdução
Historicamente, as práticas pedagógicas têm como principal foco o ensino tecnicista e mecanicista, voltado para o fomento da atividade mercantil, tradicionalmente fundamentados no processo de ensino-aprendizagem decorrente da mera transmissão repetitiva de fórmulas e conceitos, características marcantes na metodologia de ensino tradicional. A estruturação desta tendência está fundamentada em princípios básicos como: a estrutura piramidal, o formalismo, a memorização, o esforço, a competição e o respeito à autoridade. Assim sendo, o conhecimento científico funciona para o ensino médio como trampolim de ascensão ao ensino superior, ou como mera exigência para colação de grau. É urgente a necessidade de superar o atual modelo, proporcionando acesso a conhecimentos químicos que possibilitem ao indivíduo a formação de uma visão crítica, e a partir desta, possa analisar, compreender os fenômenos do seu cotidiano e interferir em situações que impliquem na degradação do meio ambiente e da sua qualidade de vida. Porém, nos últimos anos foram elaborados materiais com a finalidade de aprimorar a prática docente. São eles: as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (OCEM), os Parâmetros Curriculares para o Ensino Médio (PCNEM), e as Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+). De acordo com Brasil(2002, p.87), a Química deve ser abordada baseada na estrutura do tripé: modelos explicativos, transformações químicas e materiais e suas propriedades. A aplicação destes pilares produzirá junto ao estudante significante base de sustentação ao conhecimento acumulado. Especialmente quando a metodologia empregada for fundamentada na contextualização, no respeito ao desenvolvimento cognitivo e afetivo, no desenvolvimento de competências e habilidades em consonância com os temas e conteúdos do ensino. Em Brasil(2006, p.123) estabelece-se que, o uso do laboratório propicia muitas experiências simples nas quais as abordagens dos conteúdos químicos, extrapolam a visão restrita desses, estabelecendo articulações dinâmicas entre teoria e prática através da contextualização de conhecimentos em atividades diversificadas que priorizam a construção coletiva de significados aos conceitos, em detrimento da mera transmissão repetitiva de considerações preestabelecidas. Em Brasil (2006, p.118) é proposta a abordagem de questões inerentes ao cotidiano e de temas de interesse sociais, em oposição a experimentos meramente ilustrativos com vistas apenas nos fundamentos teóricos e de formulação de conceitos. Orienta-se que as práticas laboratoriais possibilitem a problematização das experiências químicas, e que estas sejam de relevância social, que estejam articuladas com os conceitos, que abram margem às discussões de questões inerentes ao meio ambiente, aos aspectos sociais, no sentido de aprimorar a capacidade critica dos envolvidos. Neste ensejo, a busca por um ensino de Química que contribua para formação da cidadania dos alunos, a contextualização e a interdisciplinaridade dos conteúdos são estratégias de fundamental importância. Portanto, os experimentos envolvendo os processos corrosivos focam na abordagem do contexto real de vivência dos alunos, visando evidenciar os processos ocorridos naturalmente no ambiente, bem como visam introduzir pensamentos e capacidades de aplicações tecnológicas. Logo, o que se procura com o conhecimento sobre os fenômenos corrosivos é integrar o ensino de química à preocupação com o Meio Ambiente, no sentido de desenvolver uma abordagem que contemple as ideias preservacionistas, as experiências vividas no cotidiano e a pesquisa científica. Estimulando os imprescindíveis debates a respeito dos impactos da corrosão sobre o consumo e o desenvolvimento do País, promovendo a possibilidade de que o ente em processo de aprendizagem, enquanto construtor e transformador do mundo, analise e compreenda o universo do qual faz parte, se torne cidadão socialmente responsável, adotando atitudes e valores compatíveis com a cidadania e a ecologia.
Material e métodos
Materiais: Pregos (ferro), lacres de latas de refrigerante (alumínio), pedaços de fio de cobre (24 unidades de cada); tubos de ensaio, suportes para tubos de ensaio. Soluções: Água potável e salgada (3% de NaCl), ácido clorídrico e sulfúrico 1N, ácido clorídrico e ácido sulfúrico concentrados, ácido clorídrico 0,5N, solução de NaOH 0,1N, soluções de ferricianeto, de potássio e de fenolftaleína. Antes que começassem os ensaios e ao final destes orientou-se que os alunos observassem os aspectos e consistências dos metais e soluções e que fizessem as anotações cabíveis. A experimentação I- Consistia em submergir os diferentes metais nas soluções descritas acima e fazer observações quanto às mudanças ocorridas durante os ensaios. Na bancada foram dispostos tubos de ensaio contendo: água potável e salgada (3% de NaCl), ácido clorídrico e sulfúrico 1N, ácido clorídrico e ácido sulfúrico concentrados, solução de NaOH 0,1N e de ácido clorídrico 0,5N (03 tubos para cada solução, todos enumerados 1 a 8, totalizando 24 tubos). O conteúdo dos tubos, identificado pelo número, foi anotado somente no bloco de anotação do pesquisador e revelado somente na última etapa do procedimento. Solicitou-se a voluntários que escolhessem um metal e uma solução e colocassem o material totalmente imerso no meio escolhido e em seguida exibissem o tubo de ensaio aos demais colegas. Quando todos os tubos continham metal imerso no meio corrosivo finalizou-se a primeira fase do experimento. Experimento II - Foi entregue para um voluntário uma barra de ferro previamente lixada numa placa de Petri. Orientou-se ao aluno que despejasse duas gotas da solução de cloreto de sódio sobre a barra de ferro. Posteriormente, solicitou-se que despejasse duas gotas da solução de ferricianeto de potássio sobre uma área limpa da barra de ferro. Em seguida, orientou-se que aplicasse duas gotas de fenolftaleína sobre a placa e verificasse o pH. Após cinco minutos de observação do experimento foi encerrado o procedimento experimental II. Uma semana depois houve o retorno ao laboratório para prosseguimento do experimento I. - Foram recolhidas as soluções com os metais que permaneceram em repouso durante a semana e foram expostas para que os alunos fizessem a verificação e constatação dos resultados. Foi solicitado que todos observassem os aspectos dos metais e das soluções onde estavam imersos (mudança de coloração e consistência e outros). Em seguida iniciaram-se as discussões e debates sobre os resultados observados,os efeitos de diferentes meios sobre um mesmo metal, os impactos que a corrosão tem sobre a economia do país e o meio ambiente e demais questões inerentes ao tema. Por fim, 44 alunos responderam (individualmente) a um questionário com dez perguntas sobre as observações realizadas. A pesquisa foi realizada num laboratório de química nas dependências de uma escola pública de ensino fundamental e média, em Fortaleza. Envolveu alunos de uma turma do segundo ano.
Resultado e discussão
Durante a segunda visita ao laboratório, todos puderam observar os resultados obtidos durante as experimentações. Portanto, as equipes haviam feito anotações sobre os aspectos dos metais e das soluções nas quais os metais estavam imersos, sobre mudança de coloração do metal e da solução, a consistência das soluções antes dos experimentos (se estas estavam fluidas, gelatinosa, pastosa ou arenosa), logo que eles começaram e após o repouso.
Então, em equipe, os alunos realizaram discussões sobre os aspectos das soluções em que foram adicionados os metais, sobre os metais, sobre as transformações que ocorreram em ambos durante o período em que permaneceram em repouso e durante o procedimento.
De forma sutil, buscou-se direcionar o debate iniciando as discussões sobre em quais ensaios ocorreram corrosão dos metais, em qual solução a corrosão ocorreu de forma mais rápida, em quais destas o processo havia ocorrido em maior potencial. Num segundo momento houve a comparação entre a agressividade do meio para diferentes metais e no terceiro momento foi discutido a corrosão e seus impactos relacionando-a com questões ambientais e socioculturais e outros.
A partir do que foi debatido foi possível perceber que dentre as reações em ácido clorídrico concentrado a que mais chamou a atenção foi a corrosão do alumínio, pois logo que o metal entrou em contato com o ácido se iniciou o desprendimento de gás hidrogênio em forma de fumaça, liberação de calor, e mudança, quase que instantânea, da coloração da solução de incolor para grafite. A comprovação final de que os metais foram totalmente consumidos durante os ensaios, e que as soluções mudaram de cor e consistência, e que no caso do alumínio, a solução inicial, resultou em uma pasta branca com aspecto leitoso, despertou o interesse e entusiasmo dos estudantes. A corrosão do alumínio permitiu a inserção do assunto formação de óxidos em superfícies metálicas e que isto, em alguns casos, protege alguns metais do ataque corrosivo e que a formação do óxido de alumínio em utensílios domésticos é natural e não deve ser removido, apesar do escurecimento dos mesmos.
O fato de o ácido sulfúrico concentrado dissolver somente o alumínio demonstrou a relação existente entre a agressividade do meio e metal envolvido. E possibilitou as discussões sobre a seletividade do meio corrosivo em relação ao metal envolvido, o que implica que um meio pode ser agressivo a um metal e a outro não.
A constatação de que a água potável pode agir como agente corrosivo ensejou a abordagem de questões como chuva ácida e sua relação com a poluição atmosférica, ou seja, os gases poluentes emitidos por indústrias e automóveis, e sua contribuição para a corrosão de estruturas metálicas arquitetônicas e de monumentos.
A abordagem de conceitos inerente a biocorrosão suscitou rico momento de debate, onde houve discussão sobre os ambientes propícios à proliferação de microrganismo, a implicação que os produtos metabólicos destes têm sobre os metais, o impacto que há no meio ambiente quando não há controle sobre poluição ambiental e sobre biocorrosão em plataformas petrolíferas.
Quanto à aeração diferencial, demonstraram-se, através do procedimento experimental II, as implicações que ambientes com diferente disponibilidade de gás oxigênio tem sobre a corrosão de superfícies metálicas. Ainda sobre esse aspecto, abordaram-se assuntos inerentes a indicadores naturais, tal como o estrato líquido de repolho roxo. Também houve discussão sobre a corrosão de pontes sobre mares, açudes e rios, nas quais ficam parcialmente imersas em água e expostas à atmosfera.
Depois dos debates foi possível aplicar o questionário, contendo 10 perguntas, sobre as observações feitas e cujos resultados estão descritos nos próximos parágrafos.
Quando questionados se a corrosão é um processo de oxidação, um ataque químico ou um processo eletroquímico, os alunos responderam que era uma oxidação (77,27% das respostas); enquanto 9,4% admitiram que a corrosão é um ataque químico e 13,33% afirmaram ser a corrosão um processo eletroquímico por natureza.
Diante da constatação de que diversos metais podem sofrer corrosão, como demonstrado nas aulas expositivo-experimentais, verificou-se que, ao serem indagados sobre o fato de “somente o metal ferro sofre corrosão”, 90,91% responderam que não; ao passo que 9,09% retorquiram que sim.
Durante as discussões após a realização dos experimentos, foi abordado o conceito de biocorrosão. Sendo assim, inseriu-se nos questionamentos aos alunos a seguinte pergunta: Bactérias produzem metabólitos que podem corroer metais? Tem-se 79,55% de respostas positivas, enquanto que 18,18% são respostas negativas e 2,27% não souberam responder.
Mais da metade dos alunos (72,72%) entende que não há a vinculação dos processos corrosivos a meios aquosos, enquanto que 22,74% deles acreditam que só há corrosão em presença de água ou vapor d’água, e apenas 4,54% da turma, afirmou não saber responder a pergunta.
Quando da discussão sobre a corrosão ter sua atividade acentuada pela emissão de gases das indústrias em equipamentos e eletrodomésticos, foi obtido 68,18% de resposta positiva para este fenômeno, em oposição a 29,54% de partidários da opinião de que gases expelidos pelas chaminés das indústrias não favorecem o aumento da taxa de corrosão dos eletrodomésticos instalados em seu entorno. Não responderam 2,27%.
A maioria dos alunos respondeu que a maresia ou névoa salina aumenta a taxa de corrosão de metais (68,18%), enquanto 31,82% responderam que a exposição de metais à atmosfera marítima não provoca o aumento na velocidade de corrosão destes.
Em um dos experimentos desenvolvidos, foi realizado o ensaio de verificação da corrosão do cobre. Verifica-se que 81,82% dos alunos responderam positivamente ao questionamento se há corrosão do cobre em solução ácida concentrada; enquanto 18,18% afirmaram que não.
Em relação ao meio em que o material esteja inserido, foi colocada a seguinte pergunta: A água de torneira funciona como meio corrosivo? 61,36% responderam que sim, enquanto que 38,64% disseram que não. Por outro lado, verifica-se que a noção de meio corrosivo ainda não está clara para os alunos, uma vez que na pergunta subsequente, onde foi questionado se o alumínio sofre corrosão em solução básica, 63,64% responderam que sim, contrapondo-se aos 27,27% que responderam não e, a minoria (9,09%) não respondeu.
No que diz respeito ao alumínio e o acometimento da corrosão deste pelo favorecimento de uma solução básica, constatou-se que a maioria (70,46%) dos estudantes afirma não haver corrosão do alumínio em tal situação, muito embora 20,45% dos entrevistados discordem ao afirmarem que existe corrosão do alumínio em presença de uma base forte, como é o caso do hidróxido de sódio (NaOH), e apenas 9,09% dos inquiridos não souberam responder a pergunta.
Conclusões
As perspectivas em torno do ensino apontam para o abandono da pedagogia tradicional e se posicionam em direção à democratização do conhecimento. Onde se privilegia a contextualização, o respeito ao desenvolvimento cognitivo, a realidade sócio-cultural e afetiva do aluno, o estabelecimento de relações de troca de saberes entre os envolvidos no processo educativo. No que concerne às experimentações, se propõe que estas, sejam estabelecidas baseadas no cotidiano do aluno, que tenha fundamentação na sua realidade e visem gerar ricas discussões a respeito do meio social em que o educando está inserido. Portanto, em atendimento ao preconiza as Orientações Curriculares para o Ensino Médio, a aplicação dos conhecimentos sobre corrosão nas disciplinas Química e, em especifico, físico-química demonstrou produzir satisfatório progresso no conhecimento dos alunos sobre os conceitos acerca dos processos corrosivos, isto é, sobre as reações químicas e as implicações socioeconômicas e ambientais concernentes ao tema. A abordagem do tema e as experimentações estimularam debates que propiciaram troca de conhecimento enriquecedora, onde os alunos participaram ativamente explicitando suas próprias experiências e saberes. Confirmando dessa forma que é possível aliar conhecimento científico, assuntos do cotidiano do aluno e responsabilidade sócio-ambiental. Permitindo concluir que os objetivos iniciais deste trabalho foram atingidos de forma satisfatória
Agradecimentos
Referências
BRASIL. Orientações Curriculares para o Ensino Médio: Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC, 2006.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais – Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC/Semtec, 2002.