DETECÇÃO DE MICROCISTINAS EM AMOSTRA DE ÁGUA NATURAL E POTÁVEL

ISBN 978-85-85905-19-4

Área

Química Analítica

Autores

Araújo da Silva Souto, L. (UFMA) ; Grabrielle Soares da Silvaa, F. (UFMA) ; Marques Mandaji, C. (UFMA) ; Márcia Becker, M. (UFMA) ; Paiva Silva e Silva, F.E. (UFMA) ; Silva Nunes, G. (UFMA)

Resumo

Este estudo objetivou desenvolver um biossensor amperométrico à base da enzima acetilcolinesterase ACHE (EE), para detecção indireta de microcistina-LR (MC-LR), baseada na ativação daquela pela presença desta. Foram testadas AChEs de varias fontes, livres e imobilizadas em sensores contendo como mediador eletroquímico tetracianoquinodimetano, TCNQ. Os testes de caracterização eletroquímica evidenciaram ser os biossensores precisos (CV médio intramedidas de 8,6 %) e sensíveis (LD e LQ de 0,27 e 0,91 µg L-1, respectivamente). O aumento da corrente após incubação do biossensor com a MC-LR, tanto para enzimas livres quanto para imobilizadas, mostraram que este poluente aquático é também um potente ativador da AChE, sendo possível sua detecção em níveis traços com o biossensor aqui descrito.

Palavras chaves

Microcistina-LR; Biossensores; Amperométricos

Introdução

As cianobactérias, também conhecidas como algas azuis, são bactérias Gram- negativas procariontes fotossintéticos que são encontradas em uma variedade de habitats, colonizando biótopos aquáticos e terrestres (MANKIEWICZ et al., 2003; BRIAND et al., 2003). Seu domínio sobre as demais espécies do ecossistema é uma indicação de que elas possuem algumas capacidades fisiológicas específicas que lhes permitem competir de forma muito eficiente (JAYARAJ, ANAND e RAO, 2006). Segundo MARTINS (2010), ambientes eutróficos, ou seja, rico em nutrientes, favorecem a proliferação e predominância de espécies de cianobactérias, que, por sua vez, podem produzir diversas toxinas e liberá-las no meio aquático, principalmente durante os fenômenos de florações (crescimento exuberante). Geralmente, estas florações têm grande impacto negativo nos corpos d'água alterando as características de qualidade, tais como odor e sabor, e de presença de toxinas específicas (BRASIL, 2000). A microcistina-LR é uma molécula, composta por sete aminoácidos, com peso molecular entre 0,9 a 1,0 kDaltons, classificadas como hepatotoxinas. Alguns pesquisadores da área têm mostrado que a microcistina-LR atua inibindo enzimas intracelulares denominadas fosfatases, que removem os grupamentos de fosfato das proteínas. Isso promove uma alteração na estrutura do esqueleto celular causando disfunção, ou seja, modifica a arquitetura e consequentemente a função das células do fígado. Os estudos chegam a admitir que a ação de doses sub- letais das hepatotoxinas provenientes de cianobactéria estaria associada ao desenvolvimento de câncer hepático. Esta suposição tem sido investigada na China onde existe cianobactéria nos mananciais de água fornecida a uma população que apresenta elevada frequência de dessa neoplasia (AZEVEDO, 2014). Vários métodos de detecção têm sido utilizados atualmente na detecção/quantificação de microcistinas, tais como a cromatografia líquida de alta eficiência acoplada à espectrometria de massas (HPLC/MS), os bioensaios envolvendo animais de laboratórios, os testes de inibição enzimática (via colorimetria) e os testes imunológicos baseados em ELISA (do inglês, Enzyme Linked Immunosorbent Assay) (ETCHEGARAY E BUENO, 2010; LONG et al., 2009). Apesar de várias técnicas de análise para detecção de microcistinas tais como bioensaio, ELISA, HPLC e LC-MS já serem utilizadas, o desenvolvimento de biossensores abriu novas perspectivas, pois oferece uma detecção rápida e precisa, além de alta reprodutibilidade e sensibilidade (LEBOGANG, 2014; SINGH et al. ,2012). Destaca-se ainda a possibilidade desses aparatos virem a ser portáteis, além da miniaturização e rapidez de resposta (LEITE et al., 2013). O uso dos biossensores, na maioria dos casos, não necessita de técnicos ou especialistas, podendo, para alguns protótipos, dispensar o uso de reagentes. Podem ser confeccionados para uso contínuo, em linhas no processo, ou como descartáveis. Portanto, representam uma ferramenta promissora para suplementar as técnicas analíticas existentes (SILVA, 2011). Geralmente, um biossensor permite o uso de métodos “limpos” e de baixo custo, sem precisar de pré-tratamentos morosos e de grandes volumes de amostra. O seu uso, na maioria dos casos, não necessita de técnicos ou especialistas podendo, em alguns casos dispensar o uso de reagentes, e aparecendo tanto como aparelhos de uso contínuo ou como descartáveis (SALGADO; JACOBY; PAULA, 2015). Nas últimas décadas, estão sendo efetuados esforços pela comunidade científica objetivando o desenvolvimento de metodologias mais seguras, que melhorem a seletividade e a sensibilidade dos biossensores enzimáticos baseados no monitoramento do processo de inibição por analitos potencialmente tóxicos (MARQUES & YAMANAKA, 2008). Estudos recentes demonstraram que as microcistinas-LR podem aumentar a atividade das enzimas AChEs. O presente trabalho objetivou pesquisar possíveis interações de diferentes enzimas com a MC-LR, com foco no desenvolvimento de um biossensor para detectar esse contaminante a um preço mais acessível, sendo ainda o protótipo sensível, preciso e reprodutível.

Material e métodos

Foram preparadas pastas de grafite em pó contendo hidroxicetilcelulose, HEC, soroalbumina bovina, BSA, e glutaraldeído 5%, e incorporadas, a estas pastas, AChEs extraídas de: eritrócito bovino (EB), enguia elétrica (EE) e Drosophila melanogaster (enzimas geneticamente modificadas). A outra pasta foi incorporada a enzima butirilcolinesterase (BChE) obtida de soro humano. Uma porção de 2 mg de cada pasta sensivel foi depositada no eletrodo de trabalho de sensores serigrafados. Testes envolvendo voltametria de pulso diferencial (VPD), voltametria cíclica (VC) e leituras cronoamperométricas (CA) foram realizados e construídas curvas da ativação relativa percentual (AR %) em função da concentração da MC-LR. Algumas condições operacionais, tais como potencial de trabalho, mediador eletroquímico (foram testados tetracianoquinodimetano, TCNQ, e fitalocianina de cobalto, CoPC), pH do meio e concentração do substrato, foram otimizadas. O biossensor foi levado à refrigeração a 4°C durante 24h. Aferição do sinal da corrente: Foi inserido o biossensor em conector apropriado, que tornou possível o contato entre o potenciotasto (detector) e este. Inicialmente foi registrado o sinal obtido por meio da medida cronoamperométrica do sensor imerso em solução de substrato. Logo após, o biossensor foi lavado e seco e colocado em incubação em uma solução contendo a MC-LR, após a incubação, o eletrodo foi novamente lavado e seco, medindo-se, então, o sinal da atividade enzimática com o substrato. A percentagem de ativação foi determinada pelo aumento da corrente, sendo esta proporcional à concentração da microcistina conforme a equação: AR (%)= [I- Io /I ) ] x 100, onde AR =ativação relativa; Io = intensidade de corrente antes da ativação enzimática; I = intensidade de corrente após ativação enzimática

Resultado e discussão

Testes de VPD e VC revelaram que utilizando o mediador TCNQ, em pH 7,2, foi possível realizar as medidas de corrente a um potencial de trabalho relativamente baixo ( 100 mV) versus Ag/AgCl. A presença da MC-LR claramente ativou a enzima (Fig. 1), sendo que a melhor ativação foi obtida para a AChE- EE, estando esta imobilizada (Tab. 1). Os resultados de estabilidade do biossensor, coeficiente de variação CV= 8,32%, n=10, para ensaios com o mesmo sensor e CV= 9,33%, n=10 para ensaios com sensores diferentes, sendo valores bem precisos para esse tipo de protótipo, indicando que o biossensor é preciso e sensível. O biossensor desenvolvido mostrou-se sensível, apresentando limites de detecção e quantificação 0,27 μg L-1 e 0,91μg L-1 (Tab. 1). O Ministério da Saúde editou a portaria n° 518, de 25 de março de 2004 a qual estabeleceu o valor máximo de microcistinas permitido na água de abastecimento público em 1µg. L-1, o limite de detecção encontrado é excelente para detecção de MC-LR uma vez que é menor do que valor máximo permitido pela legislação brasileira.

FIGURA 1

Voltamograma cíclico para AChE (EE) antes e após incubação com a MC-LR (mediador TCNQ).

TABELA 1

Sensibilidade do Biossensor desenvolvido

Conclusões

De modo geral, o biossensor construído demonstra ser uma opção inovadora, já que opera por ativação enzimática na detecção de MC-LR. Além de ser de fácil construção e operação e de baixo custo, o biossensor é ainda preciso e sensível, sendo portanto adequado para monitoramentos ambientais da MC-LR em ambientes aquáticos suportamente contaminados. Esse trabalho representa, pois, uma grande contribuição para áreas ambiental e da saúde pública.

Agradecimentos

À UFMA e ao NARP

Referências

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SILVA, L. M. C. Desenvolvimento de biossensores eletroquímicos para fenol e uréia com foco na aplicação ambiental. Dissertação de Mestrado (Pós-Graduação Tecnologia de Processos Químicos e Biológicos )- Escola de Química- Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011.154f.

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