Propriedades Antioxidantes do Açaí (Euterpe oleracea Mart.): Uma Abordagem para o Ensino de Química

ISBN 978-85-85905-15-6

Área

Ensino de Química

Autores

Corrêa, T.H.B. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO TRIÂNGULO MINEIRO) ; Santos Filho, P.F. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS)

Resumo

Este trabalho objetiva explorar as propriedades antioxidantes do açaí, assim como discutir os limites e possibilidades de utilização desta fruta na construção de conceitos químicos no ensino desta Ciência. O desenvolvimento do mesmo envolveu intensa revisão bibliográfica, no qual buscou-se aporte em livros didáticos, periódicos e anais de eventos científicos. Os resultados evidenciam que o estudo desta fruta - seus compostos e estruturas, assim como suas propriedades antioxidantes - pode ser utilizado para contemplar múltiplos conceitos de subáreas como orgânica e bioquímica.

Palavras chaves

agente redutor; açaí; ensino de química

Introdução

Típico da Amazônia, o açaí (Euterpe oleracea Mart.) tem se tornado um dos frutos mais apreciados dos adeptos da boa alimentação e dos frequentadores de academia devido ao seu alto poder energético (DAMASCENO et al., 2005). De acordo com Cipriano (2011), o aumento do consumo e comercialização desta fruta pode ser atribuído às suas propriedades nutricionais, já que é um alimento rico em proteínas, fibras, lipídios, vitaminas e minerais como potássio, cálcio, magnésio, fósforo, zinco, dentre outros compostos benéficos à saúde que atuam como antioxidantes, protegendo o organismo contra a ação de radicais livres (ROGEZ, 2000; PORTINHO; ZIMMERMANN & BRUCK, 2012). É importante ressaltar que a geração de radicais livres (RL) é essencial a certos mecanismos fisiológicos que desempenham funções vitais ao organismo como a defesa imunitária (BARBER & HARRIS, 1994). Contudo, a alta reatividade dessas espécies químicas (instabilidade eletrônica) também está relacionada ao desenvolvimento de patologias, uma vez que podem reagir a estruturas biológicas promovendo distintas lesões ao organismo, inclusive em biomoléculas como proteínas, ácidos nucléicos e lipídios (LIMA & ABDALLA, 2001). Embora o nosso corpo possua sistemas de defesa eficientes contra os RL, pesquisas têm apontado que uma dieta rica em frutas e verduras pode ser um importante aliado no combate (inibição) de tais espécies, sendo o açaí um alimento em potencial por apresentar classes de produtos naturais com atividade antioxidante: flavonóides, terpenos, taninos, vitamina A, C e E (CIPRIANO, 2011). Muito tem se falado sobre o papel dos antioxidantes, moléculas estas que apresentam uma excepcional facilidade de oxidação, fazendo com que funcionem como um bom agente redutor (antioxidante), uma vez que podem proteger outras espécies químicas de possíveis oxidações devido a seu próprio sacrifício (FIORUCCI; SOARES & CAVALHEIRO, 2013). Conhecidos, ainda, por atuarem no combate de radicais livres no organismo, os antioxidantes são encontrados em muitas frutas e plantas como, por exemplo, o açaí, a acerola, a pitanga, o mate verde, o café e o guaraná. Para este trabalho daremos ênfase ao açaí devido a sua atual popularidade. Frente ao exposto, o presente trabalho tem como objetivo explorar as propriedades antioxidantes do açaí, assim como discutir os limites e possibilidades de utilização desta fruta na construção de conceitos químicos no ensino desta Ciência.

Material e métodos

O desenvolvimento do trabalho envolveu intensa revisão bibliográfica. Para tanto, buscou-se aporte em livros didáticos, periódicos e anais de eventos científicos, os quais foram colocados em diálogo. Buscou-se, também, evidenciar as possibilidades de utilização do açaí no ensino de Química, assim como explorar os conceitos químicos atrelados à temática.

Resultado e discussão

Os RL são gerados de diversas formas, sendo as mais conhecidas a quebra homolítica de uma ligação covalente gerando dois RL (figura 1), ou a captura de um elétron por uma molécula formando uma espécie reativa (figura 2). Dentre os RL mais conhecidos podemos citar: o radical superóxido (O2-.); o radical hidroperoxila (HO2.); o radical hidroxila (OH.); e, o oxigênio singlete (1O2). A presença do elétron desemparelhado torna a espécie química altamente instável e, consequentemente, reativos aos componentes celulares e com tempo de vida curto. Em nosso organismo os RL podem atacar qualquer átomo presente em seu caminho, entretanto, já é conhecido a preferência destes por átomos de hidrogênios alílicos devido a alta densidade eletrônica da ligação dupla, e a possibilidade de estabilização do radical por ressonância (SOLOMONS; FRYHLE & JOHNSON, 2012). Como mencionado, o açaí é um alimento rico em antioxidantes. Mas, como esta fruta, ou melhor, seus compostos, têm se tornado um grande aliado dos adeptos da boa saúde combatendo e inibindo a ação dos radicais livres produzidos no organismo? Vitamina A, C e E A Vitamina A, também conhecida como retinol, é um micronutriente pertencente ao grupo das vitaminas lipossolúveis, assim como a vitamina E. Podendo ser encontrada no tecido animal sob a forma de retinóides ou como pró-vitamina em tecidos vegetais, sob a forma de carotenóide, no organismo humano a vitamina A pode se apresentar de três formas: retinol, retinal e ácido retinóico, sendo este último o principal e mais abundante metabólito intracelular em mamíferos (figura 3). A lipossolubilidade da vitamina A é atribuída a sua longa cadeia carbônica com a apenas um grupo polar na extremidade. Como o grupo polar constitui uma pequena parte da molécula, esta torna-se apresente pouca afinidade às espécies polares como a água e, consequentemente, solúvel em lipídios (apolar) (MARTINS; LOPES & ANDRADE, 2013). A vitamina A apresenta uma incomum função oxidante, pois ela atua nos produtos de oxidação a baixos níveis de oxigênio. Assim, o beta-caroteno que também é lipossolúvel e precursor da vitamina A, apresenta uma ótima função como eliminador do oxigênio singlete, agindo na diminuição da oxidação do DNA (ácido desoxirribonucleico) e dos lipídios (BARREIROS; DAVID & DAVID, 2006). Um outro antioxidante muito eficiente encontrado no açaí é a vitamina E (α- tocoferol) (figura 4). Embora a molécula possua uma hidroxila, a presença do anel aromático, além da longa cadeia, dá a vitamina E um elevado caráter apolar. Por ser lipossolúvel, esta se encontra presente em todas as membranas celulares (bicamada lipídica), protegendo os fosfolipídios insaturados da membrana da degeneração oxidativa das espécies reativas de oxigênio (EROS). Dessa maneira, a vitamina E atua protegendo contra o estresse oxidativo e possíveis danos como a peroxidação lipídica (KUSS, 2005). A ação antioxidande da Vitamina E está relacionada a capacidade de fornecer radical H. do grupo fenólico aos radicais produzidos, interrompendo a propagação em cadeia e evitando a ação danosa sobre as proteínas e as bases nitrogenadas do DNA (VERÇOSA, 2012). O α-tocoferol reage, primeiramente, com os radicais livres presentes no organismo, protegendo o organismo do estresse oxidativo. Durante sua oxidação, o α-tocoferol é convertido em radical tocoferoxila (BARREIROS; DAVID & DAVID, 2006). Não menos importante, a vitamina C (ácido ascórbico) é outro antioxidante presente no açaí. Diferente das vitaminas descritas, a hidrossolubilidade da vitamina C é atribuída a suas inúmeras hidroxilas (OH) (figura 5). Por ser hidrossolúvel (polar), a vitamina C reage com os RL que estão em meio aquoso, como, por exemplo, os encontrados dentro das células. A combinação entre a Vitamina E e C, é um importante fator no processo de redução dos radicais livres. Quando estas vitaminas estão presentes juntas, elas trabalham de forma sinérgica, pois a Vitamina C tem a capacidade de regenerar a forma reduzida da vitamina E (DOSSIÊ, 2009) (figura 6). Polifenóis Além das vitaminas A, C e E, o açaí ainda possui alguns outros compostos que atuam em varias vias do metabolismo ajudando no poder antioxidante e diminuído o estresse oxidativo em nosso organismo. Dentre essas estruturas destacam-se os polifenóis, os quais doam o átomo de hidrogênio do fenol presentes em suas moléculas, tornando-se assim, um bom antioxidante (QUINA & FREITAS, 2005). Dentre as classes de polifenóis mais comuns presentes no açaí podemos citar os flavonóides (resveratrol; ácido ferúlico e cianidina-3-glicosídeo) (figura 7) - componentes de baixo peso molecular os quais apresentam estrutura base C6-C3-C6 conforme a figura a seguir (figura 8). Os flavonoides são importantes antioxidantes atuando na inativação dos radicais livres em ambos os compartimentos celulares (lipofílicos e hidrofílicos) pois apresentam características polares e apolares. O pontecial antioxidante dos flavonoides é muito amplo, pois apresentam diversas mecanimos antioxidantes dependendo de sua estrutura, por exemplo, sequestro direto de radicais, regulação descendente da produção de radicais, eliminação dos precursores dos radicais, quelação de metais, inibição da xantina oxidase e elevação dos antioxidantes endógenos. Com exceção do sequestro direto de radicais, os outros mecanismos atuam como ações antioxidantes indiretos, uma vez que tem ação de prevenção da formação de radicais livres. (ADITIVOS & INGREDIENTES, 2010). Assim como os flavonoides, os taninos fazem parte dos polifenóis, sendo os mais comuns no açaí, a epicatequina e o ácido elágico (figura 9) – ambos hidrossolúveis (polar). Esses polifenóis doam o átomo de hidrogênio do fenol presentes em suas moléculas, sendo assim, um bom antioxidante (QUINA & FREITAS, 2005). Se bem observada em suas estruturas estas moléculas possuem dois anéis aromáticos com duas hidroxilas ligadas. Estes átomos de hidrogênio ligados a oxigênio podem ser facilmente reagidos com os RL, transformando-se em radical. Este novo radical formado será facilmente estabilizado por ressonância dentro do anel aromático e pelo seu outro átomo de oxigênio próximo, portanto, pouco reativo e propício para a fase de termino de um radical - ou seja - quando um radical reage com outro radical e formam uma molécula neutra (QUINA & FREITAS, 2005).







Conclusões

Frente ao exposto, nota-se que a utilização do açaí no ensino de Química apresenta uma riqueza conceitual que pode ser explorada por professores na construção do conhecimento. Os resultados evidenciam que o estudo desta fruta, seus compostos e estruturas, assim como suas propriedades antioxidantes, pode ser utilizado para contemplar múltiplos conceitos de subáreas como orgânica e bioquímica.

Agradecimentos

Referências

BARREIROS, A. L. B. S.; DAVID, J. M.; DAVID, J. P. Estresse oxidativo: relação entre geração de espécies reativas e defesa do organismo. Química nova, v.29, n. 1, p.113, 2006.
BARBER, A. D., HARRIS, S. R. Oxygen free radicals and oxidants: a review amer. Amer: Pharm., v.34, n.9, p.26-35, 1994.
CIPRIANO, P. A. Antocianinas de açaí (Euterpe oleracea Mart.) e casca de jabuticaba (Myrciaria jaboticaba) na formulação de bebidas isotônicas. (Dissertação) Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal de Viçosa, 2005.
DAMASCENO, D.; OLIVEIRA, J. C.; PINTO, P. G.; LEMES, G. G.; LEITE, V. C. Aplicação de extrato de açaí no ensino de Química. II Congresso de Pesquisa, Ensino e Extensão da UFG, 2005.
DOSSIÊ. Os antioxidantes. Food ingredientes Brasil, 2009, n.6. Disponível em: <www.revista-fi.com>. Acesso em: 20 de abril de 2015.
LIMA, E. S., ABDALLA, D. S. P. Peroxidação lipídica: mecanismos e avaliação de amostras biológicas. Revista Brasileira de Ciências Farmacêuticas, v.37, n.3, set/dez., 2001.
MARTINS, C. R.; LOPES, W. A; ANDRADE, J. B. Organic compound solubility. Química Nova, v.36, n.8, p.1248-1255, 2013.
PORTINHO, J. A.; ZIMMERMANN, L. M.; BRUCK, M. R. Efeitos benéficos do açaí. International Journal of Nutrology, v.5, n.1, p.15-20, jan./abr., 2012.
QUINA, F. H.; FREITAS, A. A. Reatividade químicas e fotoquímicas de antocianinas em sistemas organizados. Instituto de Química da USP; São Paulo, 2005. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/>. Acesso em 13 de julho de 2015.
ROGEZ, H. Açaí: Preparo, composição e melhoramento da conservação. Belém: Ed. EDUFPA, 2000.
SOLOMONS, T. W. G.; FRYHLE, C. B; JOHNSON, R. G. Química Orgânica. 10. ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, v.1, 2012.
VERÇOSA L.B. O papel da terapia nutrológica no combate e prevenção da síndrome metabólica. International Journal of Nutrology, v.5, n.2, p. 75-80, mai./ago., 2012.

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