ISBN 978-85-85905-15-6
Área
Ambiental
Autores
Monteiro, B.C. (UEAP) ; Araujo, D.M.F. (EMBRAPA) ; Rodrigues, D.M.S. (UNIFAP) ; Borges, W.L. (EMBRAPA)
Resumo
A análise de acidez potencial (H + Al) é realizada em laboratórios de fertilidade de solos empregando os métodos volumétrico ou potenciométrico SMP. No entanto, estes apresentam limitações como a falta de nitidez do indicador e geram resíduos tóxicos. Neste trabalho relatamos um método alternativo de medição empregando o tampão Sikora. Selecionou-se 36 amostras de solo com teores de H + Al entre 0,2 a 8,2 cmolc dm-3. A determinação de H + Al foi realizada pelo método volumétrico e, paralelamente pelo método do pH-Sikora. Os valores de pH-Sikora destas amostras variou entre 5,8 e 7,3 e foram correlacionados com os valores de acidez potencial apresentando correlação R2 = 0,956. A não necessidade de refazer a calibração em solos já avaliados pelo método SMP evidencia sua aplicabilidade.
Palavras chaves
Tampão Sikora; Acidez potencial; Solo
Introdução
A acidez potencial caracteriza-se pela acidez trocável além da acidez não trocável, que corresponde à acidez neutralizada. O principal componente desta acidez se deve à contribuição do hidrogênio ligado de forma covalente aos colóides do solo. Em outras palavras, caracteriza o poder tampão de acidez do solo. A sua determinação em laboratórios de fertilidade do solo é fundamental para estimar a capacidade de troca de cátions (CTC) a pH 7,0 e, em seguida, a saturação por bases (V). A quantificação destes parâmetros, H + Al, CTC e de V são de elevada relevância para estimativa da necessidade da calagem de solos (SILVA, F. B., 2009; NOGUEIRA, A. R.; SOUZA, G. B., 2005). No Brasil, o tampão SMP vem sendo empregado em diversos laboratórios de fertilidade do solo como um dos principais métodos de estimar a acidez potencial do solo e necessidade da adição de calcário. O método é de fácil execução, prático e reprodutivo, sendo, por estas razões, amplamente realizado em diversos laboratórios de solos (ESCOTESGUY, P. A. V., BISSANI, C. A., 1999; SILVA, C. A., AVELLAR, M. L., BERNARDI, A. C. C., 2000; SILVA, E. B., COSTA, H. A. O., FARNEZI, M. M. M., 2006). Os reagentes que compõem a mistura denominada SMP, no entanto, apresentam em sua composição o p- nitrofenol e o cromato de potássio, duas substâncias classificadas como resíduos de alta toxicidade. Além de caracterizar uma condição insalubre, o emprego deste tampão gera resíduos que, inevitavelmente necessitam posterior tratamento químico antes de serem finalmente descartados (SHOEMAKER, H. E., MCLEAN, E. O., PRATT, P. F., 1961). A solução SMP contém quatro substâncias químicas que atuam como bases fracas e tamponam o pH (trietanolamina, p- nitrofenol, cromato de potássio e acetato de cálcio), além de cloreto de cálcio para controlar a força iônica do meio. O método baseia-se na determinação da diminuição do pH da solução SMP tamponada a pH 7,5 quando colocada em contato com uma amostra de solo em suspensão, pois o solo comporta-se como ácido e sua acidez potencial (H + Al) é proporcional à redução do pH observado. Em alguns estados do Brasil, o SMP tornou-se o principal método de estimativa da acidez potencial do solo, graças à boa correlação que apresenta com esta propriedade do solo. Recentemente, o tampão SMP vem sendo substituído por outros métodos de quantificação da acidez potencial que minimizem a geração de resíduos de natureza tóxica (KAMINSKI, J., et al., 2007; SANTANNA, M. A. et al, 2011). O tampão desenvolvido por Sikora e colaboradores apresenta uma composição diferenciada e livre das substâncias mencionadas e tem comportamento semelhante ao SMP. O tampão desenvolvido por Sikora e colaboradores apresenta correlação com os valores de SMP e pode ser empregado para estimar a necessidade de calcário de solos. Este trabalho apresenta como principal objetivo a substituição do emprego do tampão SMP pelo Sikora para determinação da acidez potencial de solos do Amapá. As atividades na área de química geram resíduos com potencial de risco e causadoras de poluição, precisando ser tratados, reciclados ou incinerados. Esta estratégia de substituição do SMP pelo Sikora está de acordo com os princípios da Química Verde. A implantação do tampão Sikora elimina grande parte da fonte causadora de resíduos contendo cromo e 4-nitrofenol em laboratórios de fertilidade do solo (SILVA, F. M., LACERDA, P. S. B., JONES JUNIOR, J., 2005; LENARDÃO, E. J., 2003). Neste trabalho, relatamos o emprego do tampão Sikora para determinação da acidez potencial de solos, bem como a viabilidade de substituição dos métodos: volumétrico e SMP.
Material e métodos
Este trabalho foi desenvolvido no Laboratório de Solos da Embrapa Amapá. As amostras utilizadas neste ensaio foram coletadas nos Campos Experimentais da Embrapa, as quais apresentaram valores de acidez potencial no intervalo de 0,2 a 8,2 cmolc dm-3. As leituras foram realizadas em um peagametro 920 BANTE instruments utilizando um eletrodo combinado de pH de vidro e eletrodo de referência Ag/AgCl. O peagametro foi ajustado utilizando as soluções- tampão padrão de pH 4,0 e 7,0; ambas com desvio padrão de 0,02 unidades de pH. As amostras coletadas foram secas lentamente ao ar, peneiradas em malha de 2 mm de abertura e identificadas. Em seguida, foram submetidas à determinação de H + Al pela metodologia tradicional: 5 cm3 da amostra de solo foi empregada para extração com solução de acetato de cálcio 1,0 mol/L previamente ajustado para pH 7,0. Após o tempo de repouso, 50 mL do extrato foram retirados para titulação com solução NaOH 0,025 mol/L e, como indicador, fenolftaleína (SILVA, F. B., 2009; NOGUEIRA, A. R.; SOUZA, G. B., 2005). Os dados encontram-se dispostos na Tabela 1. Após obtenção dos valores de H + Al pelo método volumétrico, as amostras foram submetidas à medição potenciométrica do pH empregando a solução tampão Sikora conforme relata a literatura (KAMINSKI, J., et al., 2007; SANTANNA, M. A. et al, 2011). O tampão utilizado neste trabalho foi preparado com a seguinte composição: cloreto de potássio (KCl 74,55 g.mol-1) 1,5 mol.L-1; trietanolamina [N(CH2CH2OH)3, 149,19 g.mol-1] 52,2 mmol.L-1; imidazol (C3H4N2, 68,08 g.mol- 1) 10,3 mmol.L-1; MES (ácido 2-(N-morfolino) etanosulfônico monohidratado) (C6H13NO4S.H2O, 213,25 g.mol-1) 23,6 mmol.L-1; ácido acético glacial (CH3COOH, 60,05 g.mol-1) 67,00 mmol.L-1. O pH da solução tampão foi ajustado para 7,5 com solução concentrada de hidróxido de sódio (40% p/p). Para efetuar a medida de pH usando o tampão Sikora, empregou-se a relação 2:1:1 para tampão, água e solo, respectivamente, ou seja, são misturados 10 dm3 de solo com 10 mL de água destilada e 20 mL de tampão Sikora. O valor de pH resultante dessa medida é denominado pH-Sikora. Os dados encontram-se na Tabela 1.
Resultado e discussão
Os solos estudados apresentaram variação de acidez potencial entre 0,2 a 8,2
cmolc dm-3, cuja variação está intimamente relacionada com a acidez do solo
e alumínio trocável. Após obtenção dos dados de H + Al pelo método
volumétrico, as amostras de solo selecionadas foram submetidas à
determinação empregando o método alternativo do pH-Sikora. Observa-se que
quanto maior for o valor de pH-Sikora menor será o valor de H + Al. Como
exemplo, podemos citar na Tabela 1 – Entrada 18, o menor valor de H + Al
(1,1 cmolc dm-3) com maior valor de pH-Sikora (7,3), por outro lado
obtivemos um valor de 6,4 cmolc dm-3 de acidez potencial para o menor valor
de pH (5,8) na Tabela 1 – Entrada 25. Este comportamento também foi
observado por Santanna e colaboradores, além de um amplo exemplo de
resultados obtidos por pH SMP.
Uma vez calibrados através do pH SMP, não há necessidade de refazer a
calibração para uma série de solos já estudados, podendo utilizar o modelo
matemático para estimar a acidez potencial. Partindo desta observação, com
os valores de pH Sikora, foram calculados os teores de H + Al empregando a
equação matemática de um prévio estudo de calibração entre amostras de solo
e pH-SMP (ARAUJO et al, 2014). Naquele trabalho relatamos que a equação, H +
Al = 62,08 - 14,394 SMP + 0,8263 SMP2 relaciona o pH-SMP e os valores de H +
Al dentre 165 amostras de solo. A correlação entre os dados obtidos
apresentaram uma relação de R2 = 0,949. O emprego da solução Sikora
apresenta as mesmas características da solução SMP e dispensa uma nova
calibração. Partindo deste relato, foram relacionados os valores de H + Al
obtidos pelo método tradicional e H + Al obtidos pelo método pH-Sikora.
Foram selecionadas 36 amostras de solo provenientes do cerrado e da várzea
do Estado do Amapá. As amostras de solo estudadas foram submetidas ao ensaio
padrão de fertilidade em triplicata segundo método estabelecido pela
Embrapa. Os valores correlacionados apresentaram coeficiente R2 = 0,956. O
tampão SMP apresentou variação de pH entre 4,80 e 7,40 enquanto que o pH
Sikora apresentou variação entre 5,80 e 7,30 dentre as amostras testadas.
Este conjunto de amostras de solos demonstrou que a capacidade tamponante da
mistura Sikora é superior à do tampão SMP, indicando que pode haver alguma
dificuldade de diferenciação entre solos com teores próximos de acidez
potencial. Os dados mostram que apesar de os valores terem apresentado boa
correlação, o emprego do tampão Sikora pode ser empregado para estimativa de
H + Al, mas o método volumétrico ainda deve ser considerado o padrão.
Para este estudo, o grupo de amostras de solos selecionadas pode ser
considerado representativo, uma vez que apresenta uma ampla variação das
características de acidez potencial do solo. Os resultados aqui obtidos e o
fato de não haver necessidade de refazer a calibração em solos já avaliados
pelo método SMP justificam a aplicabilidade do tampão Sikora. O maior
diferencial em utilizar este método para determinação de rotina em um
laboratório de fertilidade de solos é sua contribuição para a gestão
ambiental. A fonte geradora de resíduos de cromo e p-nitrofenol é minimizada
e, através do emprego desta solução pode-se considerar estar de acordo com
os princípios da Química Verde. A substituição do método com as mesmas
propriedades de análise torna menos impactante a geração dos resíduos de
análise.
Valores de acidez potencial pelo método volumétrico (i), pH Sikora (ii) e método potenciométrico pH-Sikora (iii)
Correlação entre acidez potencial determinados através dos métodos volumétrico e potenciométrico Sikora
Conclusões
O emprego do tampão Sikora apresentou-se adequado para a determinação da acidez potencial de solos e possível substituto do método tradicional potenciométrico SMP, mas não do método volumétrico. A capacidade tamponante do tampão Sikora mostrou ser superior à do tampão SMP, o que dificulta a diferenciação entre algumas amostras de solos. O pH-Sikora apresentou grau de correlação R2 = 0,956, quando comparado ao método de análise tradicional (titulação com NaOH). Este método apresenta um impacto significativo na diminuição de resíduos de laboratório, uma vez que evita o emprego das substâncias de toxicidade elevada, como é o caso do uso do tampão SMP. Esta metodologia encontra-se de acordo com os princípios da Química Verde, cujos princípios sugerem que a geração de resíduos seja minimizada através da substituição por experimentos menos impactantes e que a produção de um resíduo seja evitada. O fato de não haver necessidade de refazer a calibração em solos já estudados pelo método SMP evidenciam a aplicabilidade do tampão.
Agradecimentos
Os autores agradecem à Embrapa Amapá pelo suporte à pesquisa.
Referências
ARAUJO, D. M. F., CASTRO, G. S. A., DAMASCENO, L. F., MONTAGNER, A. E. A. D., GUEDES, M. C., MELÉM JÚNIOR, N. J., Acidez potencial de solos do Estado do Amapá estimada pelo método potenciométrico SMP, Acta Iguazu, Cascavel, v.3, n.3, p. 57-65, 2014.
ESCOSTEGUY, P. A. V., BISSANI, C. A., Estimativa de H + Al pelo pH SMP em solos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.23, p.175-179, 1999.
KAMINSKI, J., RHEINHEIMER, D. S., SANTANNA, M. A., BRUNETTO, G., CASALI, C. A., TIECHER, T., TOLEDO, J. A., FRIES, H., Determinação da acidez potencial dos solos com a solução tampão Sikora como alternativa à solução SMP, XXXI Congresso Brasileiro de Ciência do Solo, Gramado, RS, 2007.
LENARDÃO, E. J., FREITAG, R. A., DABDOUB, M. J., BATISTA, A. C. F., SILVEIRA, C. C., “Green Chemistry” – Os 12 Princípios da Química Verde e sua inserção nas atividades de ensino e pesquisa, Química Nova, Vol. 26, No. 1, p.123-129, 2003.
NOGUEIRA, A. R.; SOUZA, G. B.; Manual de Laboratórios: Solo, Água, Nutrição Vegetal, Nutrição Animal e Alimentos; São Carlos, SP, 2005.
SANTANNA, M. A., KAMINSKI, J., RHEINHEIMER, D. S., TOLEDO, J. A., CASALI, C. A., Evaluation os Sikora instead of SMP buffer to estimate the potential acidity of brazillian soils, Revista Brasileira de Ciência do Solo, Vol. 35, 1707-1712, 2011.
SHOEMAKER, H. E., MCLEAN, E. O., PRATT, P. F., Buffer methods for determining the lime requirements of soils with appreciable amounts of extractable aluminum, Soil Science Society of America Proceedings, v.25, p.274-277, 1961.
SILVA, C. A., AVELLAR, M. L., BERNARDI, A. C. C., Estimativa da acidez potencial pelo pH SMP em solos do semi-árido do Nordeste Brasileiro, Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.24, p.689-692, 2000.
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SILVA, F. B; Manual de Análises Químicas de Solos, Plantas e Fertilizantes; Embrapa, 2009.
SILVA, F. M., LACERDA, P. S. B., JONES JUNIOR, J., Desenvolvimento Sustentável e Química Verde, Química Nova, v. 28, Nº1, p.103-110, 2005.