ISBN 978-85-85905-10-1
Área
Produtos Naturais
Autores
José Chagas, F. (UFRJ) ; Vianna Filho, M.D.M. (INSTITUTO DE PESQUISA JARDIM BOTÂNICO DO RIO DE JA) ; Cavalheiro, A.J. (UNESP) ; Pinto, A.C. (UFRJ) ; Costa, S.S. (UFRJ)
Resumo
Cecropia Loefl. (Urticaceae) é um gênero neotropical de espécies arbóreas, pioneiras, dioicas e medicinais, que são popularmente conhecidas como embaúbas e apresentam substâncias fenólicas e terpenoides como principais metabólitos secundários. O estudo fitoquímico da espécie C. hololeuca permitiu identificar ácidos fenólicos e flavonoides, dentre os quais, as flavonas 6-C-diglicosiladas 2’’-O-glucosil-isoorientina e 2’’-O-glucosil-isovitexina, que apresentaram o fenômeno de rotamerismo em solução de DMSO, identificado por RMN de 1H.
Palavras chaves
C. hololeuca; flavonas C-glicosiladas; rotamerismo
Introdução
Cecropia Loefl. (Urticaceae) é um gênero neotropical de espécies arbóreas, pioneiras e dioicas, popularmente chamadas de embaúba. Folhas e partes reprodutivas de embaúbas fazem parte da dieta de aves e mamíferos, sendo alguns destes dispersores de sementes. No Brasil, 26 espécies de Cecropia se distribuem por todos os biomas, e cinco destas ocorrem no estado do Rio de Janeiro: C. catharinensis, C. glaziovii, C. hololeuca, C. lyratiloba e C. pachystachya (CARAUTA, 1996; BERG & ROSSELLI, 2005). A população faz uso medicinal de embaúbas para tratar inflamações no trato respiratório, problemas cardiovasculares e o diabetes, utilizando, principalmente, extratos aquosos de suas folhas. Estudos anteriores sobre o perfil de metabólitos secundários destas espécies relatam a presença de substâncias fenólicas da classe dos ácidos fenólicos, flavonoides (flavonóis, catequinas e flavonas C-glicosiladas), flavolignanas e taninos condensados (procianidinas), além de terpenoides com esqueleto de triterpeno. (COSTA et al., 2011; LI et al., 2013). Este trabalho privilegiou o estudo fitoquímico de folhas de C. hololeuca Miq. (embaúba-prateada) com enfoque em ácidos fenólicos e flavonoides. Há registros do uso medicinal de C. hololeuca desde o século 19, sendo, inclusive, a única representante do gênero a constar na 1ª edição da Farmacopeia Brasileira de 1926, porém, poucos estudos foram realizados com esta espécie até hoje (BRANDÃO et al., 2009).
Material e métodos
Para o estudo com C. hololeuca, coletou-se uma amostra de folhas de um espécime masculino no Parque Nacional da Tijuca (Rio de Janeiro, RJ). Após a secagem e trituração das folhas, preparou-se um extrato aquoso (EA) por infusão a 5% (p/v), que, após ser liofilizado e quantificado, foi ressuspendido em água e particionado em butanol. Para a obtenção de flavonoides presentes na fração butanólica (FB), utilizaram-se as técnicas de cromatografia líquida em coluna aberta (fase estacionária: sílica silanizada RP-2; fase móvel: gradientes de água e etanol) e cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) em escala semi-preparativa (Shimadzu) (fase estacionária: sílica silanizada RP-18; fase móvel: mistura de água e metanol acidificados com ácido fórmico 0,1% (v/v)). As estruturas dos flavonoides foram propostas com base em ressonância magnética nuclear (RMN) de 1H e 13C mono e bidimensionais (MR-400 e NMRSYS-500, Varian) e espectrometria de massas com ionização por electrospray e analisador por tempo-de-voo (MicrOTof II, Bruker), em comparação com dados da literatura. Os perfis químicos do extrato aquoso, frações e de padrões comerciais de flavonoides e ácidos fenólicos foram monitorados por CLAE acoplada ao detector de arranjo de diodos (CLAE-DAD), utilizando sílica silanizada RP-18 (fase estacionária) e gradiente de água acidificada com ácido fosfórico e acetonitrila (fase móvel).
Resultado e discussão
O processo de fracionamento empregado permitiu isolar os flavonoides (3) 2’’-O-glucosil-isoorientina; (4) isoorientina; (5) 2’’-O-glucosil-isovitexina; (6) isovitexina; (7) rutina e (8) isoquercitrina. A ocorrência dos flavonoides (3) e (5) é inédita no gênero Cecropia e na família Urticaceae. Com base nas análises por CLAE-DAD (figura 1), identificaram-se ainda os ácidos fenólicos (1) 5-O-cafeoilquínico e (2) protocatecuico em EA e FB. A análise dos espectros de RMN de ¹H das flavonas 6-C-diglicosiladas (3) e (5) a 25°C revelou a presença de sinais alargados e/ou duplicados, sugerindo a existência de rotâmeros destas flavonas solubilizadas em DMSO-d6. O rotamerismo é um tipo de estereoisomerismo característico de sistemas em que a rotação em torno de uma ligação simples é impedida, produzindo uma barreira energética suficientemente elevada, de modo a permitir o isolamento ou simplesmente a detecção dos diferentes rotâmeros (Dos SANTOS et al., 2007). Para confirmar a presença de rotamerismo, obtiveram-se espectros de RMN de ¹H a 60°C. Os efeitos da variação da temperatura sobre os espectros de ambas as flavonas foram semelhantes. Em relação à aglicona, o aumento da temperatura muda completamente o perfil do pico de H-8, que, a 25°C, se encontra duplicado e com baixa intensidade (figura 2). Na região dos açúcares, nota-se que, a 60°C, os sinais de H-1’’ e H-2’’’ sofreram apenas variação no deslocamento químico. Por outro lado os sinais de H-2’’ e H-5’’’ se apresentam alargados mesmo em alta temperatura. Mas para a maior parte dos sinais este aumento de temperatura foi suficiente para se obter uma melhor resolução. Contraditoriamente, nos estudos de CHENG et al. (2000), não foram observados sinais duplicados ou alargados nos espectros de RMN (1H e 13C, em DMSO) de (5).
Cromatograma obtido por CLAE (254 nm) da fração butanólica do extrato aquoso de folhas de C. hololeuca. Concentração da amostra: 5,2 mg/ml. Volume de injeção: 20 microlitros.
Espectros de RMN de 1H de 2’’-O-glucosil-isovitexina (500 MHz; 42,5 mg/ml; DMSO).
Conclusões
Neste estudo foi desenvolvido um método eficiente para a obtenção de flavonoides de folhas de C. hololeuca, o qual poderá ser aplicado na avaliação farmacológica destes metabólitos bioativos de outras espécies de Cecropia. Foi possível também observar pela primeira vez a existência de rotâmeros para as flavonas 6-C-glicosiladas (3) 2’’-O-glucosil-isoorientina e (5) 2’’-O-glucosil-isovitexina por RMN de 1H, em DMSO.
Agradecimentos
A autora F. N. José Chagas agradece à Capes pela bolsa de doutorado.
Referências
BERG, C. C.; ROSSELLI, P.F. Cecropia. Flora Neotropica Monograph,n.94, 1-230, 2005.
BRANDÃO, M. G. L.; COSENZA, G. P.; GRAEL, C. F. F.; JUNIOR, N. L. N.; MONTE-MÓR, R. L. M. Traditional uses of American plant species from the 1st edition of Brazilian Official Pharmacopoeia. Revista Brasileira de Farmacognosia, n.19, 478-487, 2009.
CARAUTA, J. P. P. Moráceas do Estado do Rio de Janeiro. Albertoa, n.4, 145-196, 1996.
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COSTA, G. M.; SCHENKEL, E. P.; REGINATTO, F. H. Chemical and pharmacological aspects of the genus Cecropia. Natural Product Communications, n.6, 913-920, 2011.
DOS SANTOS, A. R.; PINHEIRO, A. C.; SODERO, A. C. R.; CUNHA, A. S.; PADILHA, M. C.; De SOUSA, P. M.; FONTES, S. P. Atropoisomerismo: o efeito da quiralidade axial em substâncias bioativas. Química Nova, n.30, 125-125, 2007.
LI, J.; COLEMAN, C. C.; WU, H.; BURANDT-JR, C. L.; FERREIRA, D.; ZJAWIONY, J. K. Triterpenoids and flavonoids from Cecropia schreberiana Miq. (Urticaceae). Biochemical Systematics and Ecology, n.48, 96-99, 2013.