ISBN 978-85-85905-10-1
Área
Bioquímica e Biotecnologia
Autores
Oliveira, C. (UFLA) ; Marcussi, S. (UFLA) ; Simão, A. (UFLA) ; Ramos, V. (UFLA)
Resumo
Compostos naturais têm sido amplamente estudados com o objetivo de complementar a soroterapia antiofídica. Neste trabalho avaliou-se o potencial inibidor do ácido ascórbico e do complexo vitamínico composto por ácido ascórbico, vitamina E e todas as vitaminas do complexo B sobre a atividade coagulante induzida pelas peçonhas de Bothrops moojeni, B. jararacussu e B. alternatus. O complexo vitamínico e o ácido ascórbico isoladamente inibiram a atividade coagulante das peçonhas analisadas, com os resultados mais expressivos sendo observados para o ácido ascórbico que manteve o plasma fluído por 15,52 e 30,48 minutos, nos ensaios contendo as peçonhas de B. jararacussu e B. alternatus, respectivamente, na proporção 1:5 (peçonha/ ácido ascórbico, m/m).
Palavras chaves
atividade antiofídica; compostos naturais; serpentes botrópicas
Introdução
Envenenamentos ofídicos constituem um problema de saúde publica global tanto pela sua incidência, quanto pela gravidade de seus efeitos (HARRISON et al., 2009). As consequências do envenenamento vão desde disfunções na hemostasia sanguínea, mobilidade e cognição, até danos aos tecidos, amputação do membro atingido ou óbito. No Brasil, as serpentes do gênero Bothrops (família Viperidae) são as principais responsáveis pela maioria dos acidentes ofídicos, representando cerca de 80% dos casos notificados (DE OLIVEIRA et al., 2007). A principal forma de tratamento para o envenenamento ofídico é a soroterapia utilizando anticorpos equinos, que apresenta efetividade satisfatória sobre os efeitos sistêmicos sendo pouco efetiva sobre os efeitos locais. Em adição, a soroterapia tradicional pode também induzir reações adversas, além de não estar disponível para as populações de maior risco, que habitam regiões de difícil acesso (CRUZ et al., 2009). Compostos antioxidantes têm sido visados como alternativas na inibição de toxinas de peçonhas ofídicas, considerando que grande parte da toxicidade é resultante da ação oxidativa das diversas classes de enzimas. Neste contexto, as vitaminas, principais antioxidantes obtidos pela alimentação, que atuam protegendo o organismo contra danos oxidativos e, além disso, apresentam baixo custo e facilidade de aquisição, podem se apresentar como uma estratégia promissora para atuarem como adjuvantes no tratamento do ofidismo. Diante do exposto, os objetivos neste trabalho foram avaliar o potencial inibidor do ácido ascórbico e do complexo vitamínico composto por ácido ascórbico, vitamina E e todas as vitaminas do complexo B sobre a atividade coagulante induzida por peçonhas de serpentes botrópicas.
Material e métodos
As peçonhas brutas liofilizadas de Bothrops moojeni, B. jararacussu e B. alternatus foram obtidas comercialmente no serpentário Bioagents, localizado em Batatais, São Paulo. O ácido ascórbico Sigma-Aldrich e o complexo vitamínico comercialmente em farmácia sendo composto por ácido ascórbico, vitamina E e todas as vitaminas do complexo B na proporção 1:0,1:0,28 (ácido ascórbico/vitamina E/vitaminas do complexo B, m/m/m). As peçonhas e as vitaminas foram pesadas e dissolvidas em solução salina tamponada em fosfato (PBS, pH 7,4) para a realização dos ensaios. A atividade coagulante foi realizada de acordo com metodologia descrita por Rodrigues et al. (2000) utilizando plasma humano citratado (200 µL), estabilizado à temperatura de 37°C, procedendo com a adição dos tratamentos e contagem do tempo de coagulação com leve agitação e observação constante até a formação de um coágulo sólido. O potencial das vitaminas em inibir a ação das proteases foi avaliado incubando previamente as peçonhas e vitaminas nas proporções 1:0,5, 1:1, 1:2,5 e 1:5 (peçonha/vitamina, m/m) por 5 minutos a 37° C e adicionando, em seguida as amostras à tubos contendo 200 µL de plasma. O tempo necessário para a formação do coagulo foi medido em minutos, sendo que a inibição da atividade foi observada de acordo com o aumento médio do tempo da coagulação em relação aos controles contendo apenas as peçonhas. Controles contendo apenas as vitaminas também foram realizados. Os resultados são a média de triplicata ± desvio padrão. A significância da diferença entre as médias foi analisada por uma análise de variância, seguida pelo teste de t-Student, quando os tratamentos foram comparados com o controle. Os resultados foram considerados significativos quando p ˂ 0,05.
Resultado e discussão
Nas Tabelas 1 e 2 são mostrados os efeitos inibitórios das vitaminas analisadas
sobre as enzimas das peçonhas responsáveis pela quebra de proteínas do plasma,
indutoras de coagulação. Os resultados mais expressivos foram observados para o
ácido ascórbico que inibiu a atividade coagulante de todas as peçonhas
analisadas e manteve o plasma fluído por 15,52 e 30,48 minutos, nos ensaios
contendo as peçonhas de B. jararacussu e B. alternatus, respectivamente,
na proporção 1:5 (peçonha/ ácido ascórbico, m/m) (Tabela 1).
O complexo vitamínico não foi tão eficiente quanto os tratamentos com ácido
ascórbico isolado, porém também mostrou aumento significativo no tempo de
coagulação induzida pelas peçonhas de B. alternatus, na proporção 1:2,5 e
1:5 (peçonha/complexo vitamínico, m/m) e B. moojeni, em todas as
proporções analisadas (Tabela 2). Tais resultados sugerem que as vitaminas
analisadas são capazes de interagir com componentes da cascata de coagulação
e/ou apresentam potencial de inibição de serinoproteases, principais enzimas que
atuam induzindo a coagulação, presentes nestas peçonhas.
Os efeitos protetores proporcionados pelo ácido ascórbico e pelas vitaminas
analisadas neste trabalho sobre a atividade coagulante induzida pelas peçonhas
botrópicas ainda não possuem seus mecanismos esclarecidos, porém, parte destes
efeitos provavelmente ocorreram devido às propriedades antioxidantes dessas
vitaminas.
Tabela 1. Efeito do ácido ascórbico (AA) sobre a coagulação de plasma citratado na presença de peçonhas botrópicas.
Tabela 2. Efeito do complexo vitamínico (CV) sobre a coagulação de plasma citratado na presença de peçonhas botrópicas.
Conclusões
O ácido ascórbico e o complexo vitamínico composto por ácido ascórbico, vitamina E e todas as vitaminas do complexo B mostram um relevante potencial inibidor sobre atividade coagulante induzida por peçonhas botrópicas sugerindo possíveis interações destas vitaminas com toxinas presente nas peçonhas avaliadas.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao CNPQ pela bolsa de pós-doutorado, e a FAPEMIG pelo apoio financeiro.
Referências
CRUZ, L. S.; VARGAS, R.; LOPES, A.A. Snakebite envenomation ande death in developing world. Ethinicity and disease, v.19, n.1, Suppl 1, p. 42-46, 2009.
DE OLIVEIRA, M.; CAVALCANTE, W. L. G.; ARRUDA, E. Z.; MELO, P. A.; SILVA, M. D.; GALLACCI, M. Antagonism of myotoxic and paralyzing activities of Bothrops toxin-I by suramin. Toxicon, v. 42, p. 373-379, 2007.
HARRISON, R. A.; HARGREAVES, A.; WAGSTAFF, S. C.; FARAGHER, B.; LALLOO, D. G. Snake envenoming: a disease of poverty. PLoS Neglected Tropical Diseases, v. 3, n. 12, p. e569, 2009.
RODRIGUES, V.; SOARES, A. M.; GUERRA-SÁ, R.; RODRIGUES, V.; FONTES, M. R. M.; GIGLIO, J. R. Structural and Functional Characterization of Neuwiedase, a Nonhemorrhagic Fibrin(ogen)olytic Metalloprotease from Bothrops neuwiedi Snake Venom. Archives of Biochemistry Biophysics, v. 381, p. 213-224, 2000.