53º Congresso Brasileiro de Quimica
Realizado no Rio de Janeiro/RJ, de 14 a 18 de Outubro de 2013.
ISBN: 978-85-85905-06-4

ÁREA: Ensino de Química

TÍTULO: Abordagem Historiográfica no Ensino da Ligação de Valência

AUTORES: Noel, F.M. (UFPE) ; Oliveira, S.F. (UFPE) ; Silva, J.T. (UFPE) ; Santos, J.D. (UFPE) ; Amorim, G.S. (FABEJA)

RESUMO: Neste trabalho, demonstramos como uma abordagem histórico-conceitual do conhecimento pode ser eficaz para promoção de objetivos educacionais ousados, como aquisição de postura cética e compreensão do caráter dinâmico e evolutivo do saber. Estudamos a evolução da teoria da ligação de valência e seus pressupostos epistemológicos por meio de diálogos, debates e exposições de ideias a respeito da Estrutura das Revoluções Científicas, baseando-se nas ideias de Kuhn (1970) e na abordagem historiográfica da evolução conceitual sob o enfoque “Recorrente”. Os estudantes foram avaliados por meio de questionário e as respostas interpretadas a luz da teoria de Bardin (1978). Os resultados mostram uma clara melhoria na compreensão do conteúdo, assim como o reconhecimento da faceta evolutiva do saber.

PALAVRAS CHAVES: Historiografia; Revoluções Científicas; Ligação de valência

INTRODUÇÃO: O estudo da ligação química é considerado um dos temas mais difíceis para serem abordados em sala de aula (DHINDSA; TREAGUST, 2009; PABUÇCU; GEBAN, 2012; ÜNAL, S. et, al., 2006). De fato, o estudo das ligações é um tema central na química, porém apresenta um estigma naturalmente abstrato, onde o estudante deve refletir sobre o imaterial para assim compreender adequadamente as propriedades macroscópicas. Khang e Sai (2010) demonstraram que embora os estudantes possam apresentar uma compreensão básica da ligação iônica e covalente esse conhecimento é na verdade limitado, visto que é um desafio para os estudantes aplicarem esse conhecimento em situações diferenciadas. Birk e Kurtz (1999) descobriram que os estudantes concebem a ligação covalente erroneamente como uma partilha equitativa do par de elétrons. Doravante, foi evidenciado que os estudantes compreendem mais favoravelmente a ligação iônica. É evidente que o desenvolvimento da teoria da ligação de valência tenha trilhado uma trajetória épica, no entanto, no ensino deste tópico, a trajetória que possibilitou a construção dessa teoria é esquecida. Neste sentido, desenvolvemos uma sequência didática sob o enfoque historiográfico, objetivando guiar os estudantes a uma compreensão não só do conteúdo pelo conteúdo, mas, sobretudo, criar um ambiente onde o aluno pudesse vivenciar e reconhecer a natureza do saber, o caráter não linear e transitório do processo científico. Abordamos a história no ensino de química sob o enfoque “Recorrente” (CHAMIZO, 2007). Além disso, ideias sobre a “Estrutura das Revoluções Científicas” baseadas na teoria de Kuhn (1970) foram discutidas no sentido de criar um ambiente harmônico para concretização do processo enculturação cientifica.

MATERIAL E MÉTODOS: Para realização deste estudo desenvolvemos um sequencia didática a qual designamos por HDDE (abordagem Historiográfica, Evidência de descobertas, Discussão em grupo e Exposição de ideias), por meio da qual enfatizamos na discussão escolar as raízes históricas do conhecimento acerca da ligação de valência, buscando-se contar os fatos históricos da ciência sob o enfoque “Recorrente” (CHAMIZO, 2007). A atividade foi aplicada a 26 estudantes do 1 ano do ensino médio de uma escola publica localizada no município de Lajedo-PE. Método HDDE: Inicialmente a atividade foi explicada em detalhes aos estudantes, em seguida uma miniconferência sobre a Estrutura das Revoluções Científicas (Kuhn, 1970) foi realizada. As concepções de cientista que os estudantes apresentavam foram sondadas e discutidas com o grande grupo. Logo após, os estudantes foram dispostos em grupos de discussão conceitual e recortes didáticos foram fornecidos. Em cada recorte didático havia questões contraditórias sobre a teoria da ligação de valência vigente em cada época, sendo solicitado aos estudantes que indicassem as limitações existentes. Os estudantes foram estimulados a continuamente compartilhar e defender suas ideias diante seus pares. Noutro momento, os estudantes confeccionaram cartazes que foram dispostos na classe e um minicongresso foi realizado. Durante todo procedimento, estratégias formativas de avaliação foram realizadas continuamente para fornecer feedback aos estudantes diante da dificuldades encontradas. Ao final, aplicamos aos estudantes um questionário formal composto por 5 questões, envolvendo aspectos teóricos das ligações químicas (Tabela 1). O resultado do questionário foi interpretado com base na análise de conteúdo de Bardin (1978).

RESULTADOS E DISCUSSÃO: Na miniconferência uma nova maneira de admitir o processo científico foi apresentada, neste momento os estudantes pouco participaram, mais, em grande maioria, apreciaram atentamente a explanação. Aos poucos os estudantes foram se envolvendo e ambiente de aprendizagem cada vez mais concreto foi sendo desenvolvido. No debate sobre as concepções de ciência que os estudantes traziam, varias questões foram desmistificadas. Os textos de apoio fornecidos como material complementar, mostraram uma ciência cheia de contrastes e contradições e serviram para os que estudantes pudessem mapear os pontos tênues existentes nas teorias de ligação. Este mapeamento foi concretizado em cartazes, os quais foram apresentados na sala de aula em forma de um minicongresso. Nesta etapa, os estudantes visitaram as exposições dos demais grupos e atuaram como avaliadores. Na Q1, 77% dos estudantes acreditam que o termo “ligação química” está relacionado ao compartilhamento ou perda de elétrons entre átomos. Na Q2, 69% dos estudantes expressaram que na ligação covalente os elétrons podem está distribuídos de modo não homogêneo entre as espécies atômicas, como resultado de uma diferença de eletronegatividade, apresentando polaridade na molécula como resultado da distribuição não equitativa das cargas. Na Q3, 84,5% consideram a condutividade em metais como o resultado da sua baixa eletronegatividade e elevada tendência em perder elétrons. Com relação a Q4 e Q5, respectivamente 61,5% e 69% dos alunos mencionaram que o aumento da polarização atômica, assim como íons pequenos positivos e cargas elevadas em ambos os íons pode favorecer a covalência, e que na quebra de uma ligação a distribuição dos elétrons vai depender dos átomos que constituem as moléculas e de suas cargas.

Tabela 1. Instrumento de sondagem usado para avaliação dos estudantes

Questionário composto por 5 questões utilizado como instrumento de sondagem para avaliar os estudantes ao final da implementação da sequência didática

CONCLUSÕES: Percebemos que a introdução da história da química pode contribuir potencialmente para aquisição de postura cética por parte dos alunos, assim como uma melhor compreensão da natureza da ciência e seu processo de construção. A história da evolução da teoria da ligação de valência e seus pressupostos epistemológicos recontada através do enfoque Recorrente, contribuiu para que conflitos cognitivos fossem criados. Por fim, constatamos uma clara melhoria da compreensão do conteúdo, sendo que o conceito de ligação química foi apresentado pelos estudantes de modo mais elaborado.

AGRADECIMENTOS:

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA: BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. p.225.

BIRK, J.P.; KURTZ, M.J. Effect of experience on retention and elimination of misconceptions about molecular structure and bonding. Journal of Chemical Education. n.1, v.76, p.124-128. 1999.

CHAMIZO, J. A. Teaching Modern Chemistry through Recurrent Historical Teaching Models. Science & Education. v.16, p.197-216, 2007.

DAHINDSA, H.S.; TREAGUST, D.F. Conceptual understanding of Bruneian tertiary students: Chemical bonding and structure. Brunei International Journal of Science and Mathematics Education. n.1, v.1, p.33-51, 2009.

KHANG, G. N.; SAI, C. L. Problems In The Understanding of “Chemical Bonding” From The Chemistry Textbook. Teaching and Learning. n.1, v.10, p. 68-74, 2010.

KUHN, T. S. The Structure of Scientific Revolutions. 2 ed., Chicago: Univ. of Chicago Pr., 1970, p.206.

PABUÇCU, A.; GEBAN, O. Students’ Conceptual Level of Understanding on Chemical Bonding. International Online Journal of Educational Sciences. n.4, v.3, p.563-580, 2012.

ÜNAL, S. et, al. A review of chemical bonding studies: needs, aims, methods of exploring students' conceptions, general knowledge claims and students' alternative conceptions. Research in Science & Technological Education. n.2, v.24, p.141-172, 2006.