ÁREA: Ambiental
TÍTULO: Estudo da precipitação da estruvita na urina humana visando sua utilização como um fertilizante natural
AUTORES: CARDINALI, C.R. (UFES) ; ZANCHETA, P.G. (UFES) ; BLANCK, P.L. (UFES) ; REBOUÇAS, T.C. (UFES) ; GONÇALVES, R.F. (UFES)
RESUMO: Este trabalho teve por objetivo estudar a precipitação de estruvita na urina humana visando à recuperação de P e N para posterior utilização na agricultura como um fertilizante natural. Os teste foram realizados por meio da adição de óxido de magnésio em concentrações variadas para cada 1,0L de urina. Foram analisados tanto o precipitado quanto o sobrenadante. Os resultados mostram que a remoção máxima de fósforo foi de 98,8% a uma dosagem de 0,30g/L de MgO, enquanto que para amônia o percentual foi de 21,9%, em virtude do excesso de amônia na urina. O precipitado obtido apresentou teores de macronutrientes compatíveis com os encontrados em fertilizantes industriais, mostrando o seu potencial de utilização como um fertilizante agrícola natural.
PALAVRAS CHAVES: urina humana, estruvita, fertilizante natural
INTRODUÇÃO: O reaproveitamento do esgoto doméstico, gerado em áreas urbanas, possibilita o reciclo de nutrientes para áreas agrícolas cultiváveis. Em geral só existe fluxo num sentido, isto é, os alimentos são fornecidos de áreas agrícolas para áreas urbanas, não havendo retorno de nutrientes naturais da área urbana para a agricultura. Dessa forma torna-se necessário à utilização de fertilizantes artificiais, que na maioria das vezes contém metais pesados e outros resíduos perigosos (LANGERGRABER et al., 2005).
A maior parte dos nutrientes da excreta humana se encontram na urina, e a proporção destes nutrientes (N:P:K) é muitas vezes mais apropriado para se utilizar na agricultura se comparado com a quantidade e proporção dos nutrientes presentes nos fertilizantes industriais. Um adulto pode produzir cerca de 500 litros de urina por ano, que por sua vez contém 4,0Kg de N, 400g de P e 900g de K (ESREY et al., 1998), e que se encontram na forma ideal para serem aproveitados pelas plantas: o nitrogênio na forma de uréia, o fósforo como ortofosfato e o potássio como íon livre (KIRCHMANN et al., 1995) Uma outra vantagem é que a urina apresenta concentrações muito baixas de metais pesados (JÖNSSON et al., 1997).
Sendo assim, diferentes tipos de tratamento têm sido estudados para recuperar nutrientes contidos na urina humana (MAURER et al., 2006; UDERT et al., 2003; PRONK et al., 2006). Uma forma eficiente de se recuperar fósforo é a partir da precipitação da estruvita em pH alcalino (MgNH4PO3), que pode ser utilizada na agricultura como um fertilizante natural de lenta liberação (JOHNSTON et al., 2003).
Neste contexto, este trabalho teve como objetivo estudar a recuperação de P e N da urina por meio da precipitação de estruvita visando a sua utilização como fertilizante.
MATERIAL E MÉTODOS: Os testes de precipitação foram realizados com urina sem diluição. A urina foi coletada através de um sanitário seco compartimentado, que segrega a urina das fezes e não utiliza descarga sanitária. Após a segregação a urina é conduzida a um reservatório de 20L munido de uma torneira por onde foi realizada a coleta.
A precipitação da estruvita foi realizada por meio da adição de óxido de magnésio (MgO – 98%) em concentrações variadas para cada 1,0L de urina. As concentrações foram de 0,05, 0,15, 0,30 e 0,45 g de MgO/L. Essas concentrações foram adicionadas em quatro béquers de 2,0L contendo 1,0L de urina, previamente filtrada, por meio de uma membrana de 0,45μm. Após a adição de MgO, o sistema permaneceu sob agitação a 100rpm por um período de 2h utilizando um equipamento jar-test. Terminada esta etapa, as amostras foram filtradas, e tanto o precipitado quanto o sobrenadante, analisados. Os parâmetro avaliados foram: pH, temperatura, fósforo total, nitrogênio amoniacal, cálcio, magnésio e potássio. As técnicas analíticas utilizadas seguiram os procedimentos recomendados pelo Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater – 19º Edição (APHA et al., 1995).
RESULTADOS E DISCUSSÃO: Durante o experimento, o pH da urina inicialmente em 6,50 aumentou tanto após a adição de MgO quanto no decorrer das 2hrs em virtude da hidrólise da uréia (Haneaus et al 1996). Os valores de pH encontrados foram de 7,25 para a adição de 0,05g/L de MgO, enquanto que para as demais quantidades o valor superou 9,50, atingindo assim o valor ideal para a precipitação da estruvita, que segundo Stratful et al (2001) possibilita a remoção de 97% do magnésio e de 88% do fósforo.
Os resultados mostram que a remoção média de ortofosfato (figura 1), para dois testes realizados, foi de 98,8% a uma dosagem de 0,30g/L de MgO. Ao adicionar 0,05g/L o rendimento foi de 61% em virtude do pH que foi de 7,25, isto é, abaixo do valor ideal. Para uma adição de 0,15g/L a remoção aumentou para 88,7%, sendo limitada a concentração de magnésio – fator limitante. Quanto à remoção de amônia através da precipitação da estruvita, a porcentagem é menor se comparada ao ortofosfato pelo fato da amônia estar em largo excesso. A remoção máxima encontrada foi de 21,9% a uma dosagem de 0,30g/L de óxido de magnésio.
O precipitado obtido apresentou teores elevados de N, P e Mg, além de concentrações consideráveis de Ca e K. A presença de cálcio no precipitado indica a presença de fosfatos como Ca3(PO4)2 e CaHPO4.2H2O que precipitam espontaneamente em meio básico (Udert et al, 2003), convertendo-se posteriormente na hidroxiapatita - Ca5(PO4)3OH.
Comparando o valor obtido da análise do precipitado com os teores encontrados em fertilizantes industriais do fabricante IAP, como os fosfatados, nitrogenados e o sulfato de potássio e magnésio, observa-se que os teores de N, P, K, Ca e Mg (tabela 1), são compatíveis, e em alguns casos superiores aos encontrados nos fertilizantes industriais.
CONCLUSÕES: A remoção máxima de P foi obtida utilizando uma dosagem de 0,3g/L de MgO, alcançando assim, uma remoção de 98% do fósforo. Quanto ao nitrogênio, a remoção máxima foi de 21,9% a uma dosagem de 0,30g/L de MgO, em virtude do excesso de amônia na urina. O precipitado obtido apresentou teores elevados de P, N e Mg, compatíveis com os encontrados em fertilizantes químicos industriais, mostrando que tal prática pode ser uma alternativa interessante sob o ponto de ambiental, na medida em que recupera nutrientes para a agricultura e podendo minimizar o consumo de fertilizantes industriais.
AGRADECIMENTOS: Ao Programa de Pesquisa em Saneamento Básico PROSAB 4 - Tema 5, pelo financiamento do projeto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA: ESREY, S.A; GOUGH, J.; RAPAPORT, D.; SAWYER, R., SIMPSON-HÉBERT, M..; VARGAS, J., WINBLAD, U. 1998. Ecological Sanitation. Estocolmo: SIDA.
HANEAUS, Å., HELLSTRÖM, D. JOHANSSEN, E. 1996. Conversion of urea during storage of human urine. Vatten. 52: 263-270.
JÖNSSON, H.; STENSTRÖM, T.; SVENSSON, J.; SUNDIN, A. 1997. Source separated urine-nutrient and heavy metal content, water saving and faecal contamination. Water Science & Technology. 35: 145-152.
KIRCHMANN, H; PETTERSSON, S. 1995. Human urine - chemical composition and fertilizer use efficiency. Fertilizer Research. 40: 149-154.
LANGERGRABER, G.; MUELLEGGER, E. 2005. Ecological sanitation – a way to solve global sanitation problems?. Environment International. 31: 433-444.
MAURER, M., PRONK, W., LARSEN, T.A. 2006. Treatment processes for source separated urine. Water Research. 40: 3151–3166.
PRONK, W., BIEBOW, M., BOLLER, M. 2006. Treatment of source separated urine by a combination of bipolar electrodialysis and a gas transfer membrane. Water Science & Technology. 53: 139–146.
STRATFUL, I.; LESTER, J. N.; SCRIMSHAW, M. D. 2001. Conditions influencing the precipitation of magnesium ammonium phosphate. Water Research. 35: 4191-4199.
UDERT, K.M., FUX, C., MÜNSTER, M., LARSEN, T.A., SIEGRIST, H., GUJER, W. 2003. Nitrification and autotrophic denitrification of source-separated urine. Water Science Technology. 48: 119–130.