ÁREA: Alimentos
TÍTULO: DETERMINAÇÃO DO TEOR DE ÁCIDO CIANÍDRICO EM FOLHAS DE MANDIOCA (Manihot esculenta Crantz) DESIDRATADAS
AUTORES: FURTUNATO, D.M.N. (UFBA) ; ALMEIDA, D.T. (UFBA) ; CARDOSO, L.A. (UFBA)
RESUMO: No Brasil, o “pó” de folhas de mandioca vem sendo utilizado como componente de “multimistura”, acrescidos à merenda escolar e cestas básicas para famílias carentes, visando o combate à desnutrição infantil - anemia ferropriva - por apresentar elevados teores protéicos, de vitamina e minerais. No entanto, as folhas de mandioca frescas contem linamarina, um beta-glicosídeo de acetona cianidrina e etil-metil-cetona-cianidrina que, ao sofrerem hidrólise, liberam o ácido cianídrico, tóxico aos seres humanos. O conteúdo de cianeto nestas folhas, de diferentes cultivares, é muito variado em decorrência da forma de secagem das folhas, a idade da planta e dos fatores genéticos. O objetivo do presente trabalho foi analisar amostras de pó de folhas de mandioca comercializadas e consumidas em Salvador
PALAVRAS CHAVES: ácido cianídrico, multimistura, folhas de mandioca
INTRODUÇÃO: No Brasil, na década de 80, ocorreu ampla difusão quanto ao uso de fontes alimentares alternativas visando melhorar e ou recuperar o estado nutricional de gestantes, nutrizes e crianças, destacando-se a multimistura, elaborada com subprodutos alimentares moídos e ou torrados (farelos de trigo, arroz, fubá, pós das folhas verdes de mandioca, abóbora, taioba, cascas de ovos, sementes de abóbora, melancia, entre outras (BRANDÃO,1997; CAMARA,1996). Apesar de ser rica em proteína, vitamina A, ferro, cálcio, vitamina C e fósforo, a folha de mandioca contêm linamarina e etil-metil-cetona-cianidrina que, ao sofrerem hidrólise, liberam HCN, tóxico aos seres humanos, pela ação da enzima linamarase, em plantas cujos tecidos foram danificados através da secagem das folhas ou pela ação da beta-glicosidade no trato digestório de animais (OKOLIE, et al,1989; CORRÊA, et al., 2002). O conteúdo de HCN na planta varia de uma espécie para outra, devido a vários fatores (VITTI, et al,1972; MOLINA,1989; ESSERS,1994). Em relação ao teor de HCN na raiz fresca sem casca, as cultivares são classificadas em mansas (aipim ou macaxeira), moderadamente venenosas, bravas ou venenosas (<50 mg, entre 50 a 100 mg, e > 100 mg de HCN/Kg, respectivamente) (CAGNON et al., 2002). A dose letal de HCN oscila entre 50 a 60 mg/Kg peso (IEN, et al.,1991; FENNEMA,1993; WHO,1993). Segundo BOKANGA(1994), o potencial cianogênico das folhas da mandioca é 5 a 20 vezes maior que o da raiz, devido a maior atividade da linamarase. O uso destas folhas é possível se o material for submetido a processos apropriados (CARVALHO,1981; MOLINA,1989). Para consumo humano, as cultivares devem apresentar menos de 50ppm ou 50mg de ácido cianídrico (HCN) por quilograma de raízes (EMBRAPA)
MATERIAL E MÉTODOS: Foram coletadas seis amostras de pó de folhas desidratadas de mandioca obtidas na Assoc. de Edu. em Saúde de Salvador - Botica da Terra, elaboradas em diferentes localidades, comercializadas e acondicionadas em recipiente plástico transparente fechados com tampa plástica sob pressão e revestidos externamente com filme plástico de PVC. A metodologia empregada foi desenvolvida por (BRADBURY, M. G, at al., 1999), composto por um kit contendo: manual, balança de plástico com peso de 100 mg, recipientes e pipetas graduadas de plástico de 1mL, discos tampões pH 6 e a linamarase, papéis picrato, figura colorida para comparação dos resultados (Figura 1). De cada amostra adquirida, pesou-se, em balança analítica, 100 mg em triplicatas, acondicionando-as ao recipiente contendo o disco com a enzima linamarase e o tampão. Em seguida, introduziu-se cada subamostra no recipiente e acrescentou-se 0,5 mL de água deionizada. Imediatamente foi adicionado o papel picrato colado a um suporte de plástico. Os recipientes foram fechados e deixados à temperatura ambiente por 24 horas. Os brancos foram preparados com a mesma metodologia. Decorrido esse tempo, o papel picrato foi retirado cuidadosamente do plástico com uma pinça, e colocado em um tubo de ensaio. Adicionou-se 5 mL de água deionizada, em seguida foram tampados. Os tubos foram deixados à temperatura ambiente por 30 minutos, sendo ocasionalmente homogeneizados. O mesmo procedimento foi feito com o branco e o padrão. Após o tempo determinado, foram feitas as leituras em espectrofotômetro a 510 nm. O total de HCN foi determinado multiplicando-se a absorbância obtida x 396. O resultado foi expresso em mg/Kg do produto analisado. As análises referentes aos padrões, seguiram a metodologia acima descrita, colocando-se o disco referente ao padrão, ao invés da amostra. Após o tempo determinado, os recipientes foram abertos dentro de uma capela de exaustão e as amostras foram lidas comparando-se os resultados com os da Figura 1.
RESULTADOS E DISCUSSÃO: Conforme os resultados apresentados na Figura 2, os teores médios de ácido cianídrico oscilaram entre 15,5-42,59 mg/Kg, portanto, em desacordo com a Resolução – RDC n.º 53 de 15 junho de 2000. Estes elevados níveis também apontam para não adequação na forma de preparo. No Brasil o consumo de folhas de mandioca não se constitui em um hábito alimentar, excetuando-se a maniçoba, prato de origem indígena predominante no Pará e Recôncavo Baiano. Para o preparo da maniçoba as folhas são moídas e cozidas durante uma semana, o que elimina o ácido cianídrico. Outrossim, alguns estudos recomendam que para elaboração do pó, as folhas devem ser primeiro picadas e só então levadas para secar a sombra, o que possibilita maior liberação dos compostos cianogênicos (CORREA, et al., 2002).
CONCLUSÕES: Não existe uma legislação especifica para o teor de ácido cianídrico em folhas da mandioca destinadas ao consumo humano. No entanto, a Resolução nº 53, de 15 de junho de 2000 da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) fixa a identidade e as características mínimas de qualidade para a multimistura (BRASIL, 2000), estabelecendo o teor máximo em 4 ppm. de ácido cianídrico em mg/Kg.
Pelos resultados obtidos neste experimento, conclui-se que 100% das amostras analisadas estão fora dos valores permitidos pela Resolução – RDC n.º 53 de 15 junho de 2000.
AGRADECIMENTOS: o Professor Dr.Howard Bradbury, da School of Botany and Zoology Australian National University pela doação do KITB2 usado nas análises
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA: BOKANGA, M. Processing of cassava leaves for human consumption
M International Workshop on Cassava Safety 375, 1994.
BRADBURY, M. G.; EGAN, S.V.; BRADBURY, J.H. determination of all forms of cyanogens in cassava roots and cassava products using picrate paper kits. Journal Science Food Agricultural. v. 79, p. 593-601, 1999.
BRANDÃO, T. C.; BRANDÃO, R.F. Alimentação Alternativa. Brasília, Ministério da Saúde, 2ed., 1997, 95p.
BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução – RDC n.o 53 de 15 junho de 2000. Regulamento Técnico para fixação de Identidade e Qualidade de Mistura à Base de Farelo de Cereais. Brasília , 2000. 12p.
CÂMARA, S. F. Multimistura: composição química, fatores tóxicos e/ou antinutricionais. Dissertação de Mestrado, 1996. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 1996, 64p.
CAGNON, J. R.; CEREDA, M. P.; PANTAROTTO, S. In Cd-rom. Série: Cultura de tuberosas amiláceas latino-americanas. Vol.2 – Cultura de tuberosas amiláceas latino-americanas. Fundação Cargill. Ago/2002.
CORRÊA, A.D; SANTOS, C.D., NATIVIDADE, M.A.E., ABREU, C.M.P., XISTO, A.L.R.P., CARVALHO, V.D. farinha de folhas de mandioca l- Efeito da secagem ds folhas sobre atividade linamarase. Ciênc. Agrotec. Lavras, v.26, n.2, p368-374, 2002.
DIASOLUA, et al. Cassava cyanogens and free amino acids in raw and cooked leaves. Food and Chemical Toxicology. Pergamon, v.41, n.1, p. 1193-1197, 2003.
EMBRAPA. Cultivo da Mandioca para a Região Semi-Árida. Disponível em:http://sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/FontesHTML/Mandioca/mandioca_semiarido/cultivares.htm. Acessado em: 21 de junho de 2007.
FENNEMA, O.R. Química de Los Alimentos. São Paulo: Acribia, 1993, 1095p.
MADRUGA, et al. Avaliação nutricional de uma dieta suplementada com multimistura: Estudo em ratos. Revista Ciência e Tecnologia de alimentos. Campinas, v.24, n.1, p.129-133, 2004.